26.1.18

Quinta do Outeiro (Amarante)


Na terra de Amadeo e Pascoaes

Amarante é um dos segredos mais bem guardados do país. O Tâmega atravessa a cidade sob um panorama deslumbrante, através de um centro histórico belíssimo, onde o museu de Amadeo de Souza Cardoso e a adjacente igreja de São Gonçalo são marcos a não perder. Igualmente notória é a doçaria, onde imperam os ovos: as lérias, os papos d’anjo , os foguetes, os São Gonçalos e as brisas do Tâmega. 

Sempre se comeu bem em Amarante. Desde há uns anos que tenho vindo a acompanhar – e a confirmar – o esforço notável de melhoria, no serviço e na qualidade, que tem vindo a ser feito na Quinta do Outeiro, um restaurante numa moradia no lugar do mesmo nome, a que se acede, com grande facilidade, quando se circula pela A4, dela saindo, para quem vem do Porto, antes da grande ponte sobre o Tâmega.

A Quinta do Outeiro fica num alto, com vista sobre a cidade, com amplo espaço para estacionamento, o que, como é sabido, é uma preciosidade nos dias que correm. Por alguns anos, dispunha de uma única, embora ampla, sala. Agora, expandiu-se por um elegante espaço, amplamente envidraçado, sem, no entanto, ter visto a qualidade da oferta gastronómica minimamente afetada, como às vezes acontece. E também serviço teve um “upgrading”, sem, no entanto, perder o caráter genuíno e de simpatia. Como cliente habitual, desde os primeiros tempos, constato que nunca dali saí desiludido.

Passei por lá há dias, numa noite muito movimentada, próxima do Natal. E a refeição correu muito bem, sem uma falha nos pratos pedidos, com um atendimento rigoroso. 

Nas entradas propostas, fomos parcos: optámos por uma excelente alheira com grelos e um salpicão da Serra do Marão. Mas havia pataniscas, bolinhos ou salada de bacalhau, rojõezinhos, orelheira com molho verde e cogumelos salteados. Espargos ou melão com presunto também estavam disponíveis.

A casa opta, e bem, por uma lista curta nos pratos “de substância”, com meia dose ou dose completa para duas pessoas, a preço muito razoável, variando todos os dias. 

Nos peixes, além de salmão grelhado e pescada suada, havia um bacalhau com crosta de broa e batata a murro, com muito bom aspecto. Mas escolheu-se – e não ficámos arrependidos – um excelente bacalhau dourado, com demolho no ponto. 

Nas carnes, a casa excela. Há um javali estufado em verde tinto, um espeto de novilho com presunto, um medalhão de vitela com molho de mostarda, uns rojões com castanhas, um tornedó de vitela com queijo da serra e maçã assada. Mas decidiu-se fazer o teste supremo: pedir uma posta de vitela com batata a murro. E a Quinta do Outeiro passou amplamente, com a carne maronesa, muito bem temperada, como expectável menos suave que a barrosã, mas muito saborosa. Atenção! Recordo-me que, em certos dias, há por ali um excelente cabrito e, dizem-me, um cozido à portuguesa “de se lhe tirar o chapéu”.

Nas sobremesas, optou-se pelas sazonais rabanadas, mas destaco da lista os amarantinos, os pudins de ovos ou de ananás, os bolos de cenoura e nozes ou de bolacha, o quindim, etc.

A lista de vinhos é agradável, sem ser esplendorosa. Se pedir o vinho da casa, atenção!, ser-lhe-á servido verde, mas há vários maduros excelentes. 

A Quinta do Outeiro que, repito, tem vindo a melhorar, é hoje um valor seguro, a que sempre recorro com gosto, na bela terra de Amadeo e de Pascoaes.



Quinta do Outeiro
Rua do Outeiro de Baixo, 15
Tlf. 255 010 092
Amarante
Wifi
Estacionamento próprio
Preço médio: 25 euros
Não fecha

24.1.18

Trattoria (Lisboa)


Ontem à noite, ao entrar para jantar na Trattoria, o restaurante que fica quase na esquina da rua Artilharia 1 com a avenida Joaquim António de Aguiar, hesitei: estaria fechado? Mas eu tinha reservado! A porta estava escura, era difícil a um passante pensar que o restaurante estivesse aberto. Um casal brasileiro que nos acompanhava, frequentadores regulares de Lisboa e daquela zona, disse-me ter tido frequentemente a mesma sensação. A Trattoria não é, mas às vezes pode parecer, um restaurante “clandestino”. Porquê?

E, contudo, a Trattoria é um excelente lugar para se ter uma boa refeição, com pratos italianos (e não só) de muito boa qualidade e apresentação, a um preço agradável. O serviço é cuidado, o espaço é diversificado. À hora de almoço é um restaurante muito movimentado, mas é decididamente um lugar para “connoisseurs”, que não investe muito na hora de jantar. Dá ideia que a Trattoria tem mesmo a “snobeira” de querer passar despercebido! 

Visitem a Trattoria e verão que não se arrependem.

14.1.18

Quatro dias, cinco mesas


O Alentejo, em matéria de restaurantes, é uma “nação” (como se diz no Porto)! Não conheço zona do país (excetuando o Algarve, que é uma espécie de “offshore” em termos gastronómicos) onde haja uma concentração tão forte de boas mesas, onde a probabilidade de se não ter uma desilusão quando se entra numa casa desconhecida seja tão baixa. Confirmei isso agora, nuns dias que passei em Arraiolos.

Deixo cinco notas.

A primeira, e com destaque, gostei imenso da experiência do restaurante Gadanha (com a sua Mercearia), no centro de Estremoz. Uma lista criativa, bela apresentação, um serviço muito profissional, um local a revisitar com grande prazer. Preço a condizer.

Em Arraiolos, três notas. 

Na Pousada Convento de Arraiolos, num espaço hoteleiro hoje um pouco descuidado, tive, contudo, uma boa refeição, com um serviço atento e simpático. O preço foi o das pousadas, que não é baixo

No centro da vila, duas experiências. 

A primeira no restaurante Alpendre, um clássico, com decoração rústica bem alentejana, ficámos com “mixed feelings”. Tem uma carta ambiciosa que, no entanto, necessita de dar mais garantias na qualidade do que é servido. Serviço agradável. Preço razoável. Há que voltar.

A segunda foi na Moagem. Uma casa mais modesta, mas em que fomos bastante bem servidos, com o dono da casa a atender uma sala cheia. Preço bastante razoável.

Finalmente, já de saída, em Lavre, entre Montemor e Coruche, no Maçã, num almoço de domingo, com casa a abarrotar, tivémos um ótimo almoço. A sala é banal, as mesas um pouco encavalitadas, mas o serviço, apesar de lento, foi capaz e atento. O preço foi muito agradável.

10.1.18

O conceito


“Conhece o nosso conceito?” Foi já há alguns anos. Não percebi o que é que a jovem que me recebia no restaurante queria dizer com aquela pergunta. Devo ter feito uma cara de espanto, o que a levou, generosamente, a elucidar-me: “Gostava de lhe explicar o conceito do nosso restaurante”. 

O ”conceito”, na novilíngua restaurantista, é o modelo que marca a forma, necessariamente atípica, como se vai passar a refeição: ou há uma compra do vinho numa loja à parte, ou somos conduzidos através de espaços geográficos diferenciados da casa onde se passam “tempos” restaurativos ou beberricais diferentes, ou a ordem dos pratos segue um ”percurso” que o “chef” desenhou para diferenciar a sua “assinatura” na obra-de-arte que vamos ser convidados a “experienciar” (um vocábulo que abomino) - e a pagar com língua de palmo, claro.

O mundo dos restaurantes com “conceito” anda aí com força. Deve haver quem goste, imagino.