21.12.14

Que batatas são estas?!


Dois restaurantes de qualidade em Vila Real, duas más experiências com batatas pequenas "a murro": farinhentas, sem consistência, com sabor adocicado. Que se passa? Parece que não sou o primeiro a queixar-me e que a fornecedora é a mesma. Atenção agora às batatas para acompanhar o bacalhau cozido na noite de Consoada! Já recomendei uma ida ao Pingo Doce...

5.12.14

Prémio "Maria de Lourdes Modesto"

Hoje, a Academia Portuguesa de Gastronomia, presidida por José Bento dos Santos e da qual faço parte, procedeu, no Grémio Literário, à entrega anual dos seus prémios. Com um almoço, naturalmente.
 
Dentre eles, quero destacar o prémio "Maria de Lourdes Modesto", destinado a premiar, "a título excecional", "um restaurante de cozinha tradicional portuguesa de grande qualidade". A distinção, cujo merecimento pessoalmente reitero, foi para o transmontano "Geadas", um excelente restaurante da cidade de Bragança.
 
Na ocasião, tive o gosto de conhecer a patrona do prémio, Maria de Lourdes Modesto. Para além de fazer parte da memória televisiva da minha geração, a ela se deve uma cuidadosa recolha de receituário culinário português que muito tem contribuído para a fixação desse nosso património cultural.

28.9.14

O Funil

"O Funil" foi, por muitos anos, um restaurante clássico, sólido, numa zona pouco pródiga a bons exemplos gastronómicos como é a da avenida 5 de outubro, no topo junto ao Saldanha.

Da época da criação de "O Funil", do início dos anos 70, creio que resta apenas "A Colina", na rua Filipe Folque, junto à avenida Duque de Ávila (onde continua a comer-se bem, agora com um agradável andar superior) e, um pouco mais longe, na avenida Conde Valbom, a "Laurentina" do bacalhau. Isto, claro, se não contarmos com a vizinha avenida da República, onde ainda subsiste, com garbo e graça, a "Versailles" e, do outro lado, esse monumento à nostalgia que ainda é o "Galeto" (creio que o único restaurante onde os preços sobem depois das 22 horas). Quase tudo o que de interessante houve por ali por perto, foi desaparecendo, desde o clássico "Toni dos Bifes" ao excelente "5 do 10", já para não falar do dueto maravilha que eram o "Monumental" e o "Montecarlo".

Voltemos a "O Funil". Há uns anos, tinha passado por lá, subi a escada ao andar superior e encontrei uma casa preservada, mas sem nenhuma graça especial, salvo o facto de ser ainda então, como sempre foi (e como "A Colina" ainda é), um restaurante de famílias, nos fins de semana. Ontem, deu-me para ir por lá de novo. E, devo dizer, tive uma surpresa muito agradável.

No aspeto, "O Funil" mudou imenso. Reabriu em agosto. É agora no rés-do-chão, num espaço moderno, muito bem decorado. A lista tem um bom equilíbrio, com sete entradas, oito pratos de carne e outros tantos de peixe, basicamente assente na cozinha portuguesa tradicional. Provaram-se umas ótimas entradas de alheira, umas lulas à algarvia com arroz de alho (tenríssimas!) e um excelente ensopado de borrego, no tacho, como mandam as regras. Para uma outra vez, iremos fazer outras "visitas" à lista, tentando alguns "clássicos" (arroz de tamboril e camarão, bacalhau à Braz, as carnes de porco à alentejana e à portuguesa, o arroz de pato à antiga e o cordeiro de leite). Se a qualidade acompanhar o que ontem provámos, o sucesso da casa está garantido. Ah! e nas sobremesas, provámos dois doces estupendos, dentro doçaria portuguesa tradicional. À lista de vinhos, com preços muito razoáveis, fazem falta alguns rótulos mais conhecidos, nomeadamente do Douro e Alentejo, mas o vinho recomendado pela casa era excelente. O preço final foi muito razoável. Ao almoço, segundo nos informaram, há um menu especial, com valores em conta.

O serviço foi atentíssimo, conhecedor e diligente. Só se pode esperar que tudo assim se mantenha. "O Funil", num registo estético muito diverso da velha casa tradicional, soube conservar a sua fidelidade à culinária portuguesa, modernizando-a sem a descaraterizar. É uma ótima opção, numa área onde não há muitas. E onde, à noite, é ainda possível encontrar lugar para estacionar. Experimentem! Mas não vá lá hoje, domingo, porque é o dia que fecha.

"O Funil", avenida Elias Garcia, nº 82, Lisboa, tel. 217966007

7.8.14

Comporta & afins

Ilha do Arroz

Por obra e graça dos Espírito Santo, a Comporta está este ano na moda negativa do país. Ninguém espera ver por lá as "tias" que - lembram-se? - há um ano diziam que andavam por ali "a brincar aos pobrezinhos", mas o lugar não morreu. E ainda bem, até porque tudo aquilo é magnífico (tirando os mosquitos).

Os dois restaurantes da praia por lá estão. E estão bem.

O "Ilha do Arroz" pareceu-me este ano um pouco menos 'in", mas só fiz a experiência de ambos ao jantar. Os preços são ligeiramente mais baixos do que no vizinho "Comporta Café", mas em ambos se comeu bastante bem. Pena é que os tais mosquitos nos impeçam de usufruir os belos espaços exteriores, sobre a praia.

O pessoal de ambos os restaurantes é simpático, prestável, com um profissionalismo "solto", nada presunçoso, o que começa a ser raro neste tipo de locais de turismo. O preço não é baixo mas, com algum cuidado na aceitação das entradas propostas e na escolha das sobremesas, consegue-se controlar a adição final, até porque em ambos há vinhos a preços razoáveis - para além dos que estão na lista só para uma certa clientela que se sabe.

Comporta Café

Fora da Praia, junto à localidade da Comporta, está o inevitável "Museu do Arroz", demasiado "trendy" para o meu gosto, mas também um lugar interessante para se ir.

Museu do Arroz

Prefiro, contudo, o menos pretensioso mas excelente "Dona Bia", um pouco mais afastado. Muita gente considera-o a melhor relação qualidade-preço da zona. 

Dona Bia

Dentro da localidade da Comporta, a grande novidade do ano é a "Cavalariça". O ambiente é simpático, a comida inventiva, há no ar alguma pretensão, que se reflete nos preços, um pouco para o "puxadote". Mas é o que está na moda!

Ainda na aldeia da Comporta, falam-me bem do "Central", mas não pude visitar. E há outros locais.

Um pouco mais distante, na praia do Carvalhal, o "Restaurante dos Pescadores", com ambiente simples mas muito bom peixe, tem, contudo, um serviço amador, que pode tornar-se irritante. Preço a condizer. Mas fui por lá duas vezes e comi sempre bem.

Faltou-me experimentar o "Sal", na praia do Pego, de que me falam bem.

Na Carrasqueira, a alguns quilómetros de distância, há sempre escolha. A meu gosto, o mais recomendável local é o "Retiro do Pescador", sob a batuta da simpática Sílvia. Em caso de enchente, tente-se o "Rola" e o "Gonçalves". A aproveite o local para adquirir produtos do mar.


Retiro do Pescador

No caso de se avançar para a zona de Alcácer (isto é, para quem vier para a península de Tróia sem ser pelo "ferry", com origem em Setúbal), vale a pena visitar "A Escola", um projeto já com muitos anos - que foi, verdadeiramente,o primeiro restaurante que conheci na região.

A Escola

Finalmente: e Tróia? Lamento muito mas nada tenho a dizer e, creio, isso diz tudo. Em Soltróia, sem pretensões algumas, mas agradável e a bom preço, pode visitar-se o "Tróia Azul", no famoso "Pereira". Tive curiosidade, mas não tempo para visitar o "Fio", perto da chegada dos "ferries".

26.7.14

Uma semana a Norte

O Norte do país é a lugar de muito boas mesas restaurativas, como se tem assinalado por aqui. Na semana que agora termina,, fez-se um percurso por algumas delas, com sucesso diferenciado mas com bons resultados a registar.


No Porto, experimentou-se, pela primeira vez, o "LSD", um espaço no largo de S. Domingos, no fundo da rua das Flores, junto a dois bons restaurantes como o "DOP" e o "Traça". Num local onde funcionou, por algum tempo, o "Tea House", abriu, há não muito, este novo conceito, com alguma proximidade com os já aqui referidos "Casa de Pasto da Palmeira", na Foz, e "Barco Boador" (assim mesmo, com B), em Espinho. Devo dizer, contudo, que este "LSD" é de uma qualidade bem superior aos seus homólogos, com uma comida cuidada e inventiva, bela apresentação, um serviço cuidado e muito bom vinho ao copo. Uma excelente opção, com preços aceitáveis, num local bem decorado.
Não muito longe dali, na praça da Liberade, ao fundo da avenida dos Aliados, no Passeio das Cardosas, na esquina do Hotel Intercontinental que dá para a estação ferroviária de S. Bento, situa-se o "Astória", um restaurante moderno, que faz renascer, naquele mesmo espaço, a memória de um café que aí existiu e que eu frequentava nos anos 60 (abria às 6 da manhã e foi aí que terminei muitas noitadas...). O novo "Astória" surge com alguma pretensão estética e gastronómica e, embora me digam que, ao jantar, está com menos sucesso do que mereceria, é sem a menor dúvida um bom local para um almoço agradável, com uma cozinha relativamente sofisticada e saudável, à altura daquilo que claramente escasseia por aquela zona da cidade. O menu "executivo" tem um preço razoável e a rimar bem com a sua qualidade.
Há anos que não passava pela "Cozinha da Terra", uma casa de pedra e heras em Louredo, onde se acede saindo da A4 em Paredes. É preciso andar ainda pelo campo aí uns 7 quilómetros para chegar a este restaurante, onde se bate à porta. Mas, como diria o guia dos pneus, "vaut le détour". Come-se extraordinariamente bem neste local. Comida sólida, feita em forno de lenha, produtos de grande qualidade, um ambiente "rústico fino" (julgo que entendem o que quero dizer) e uma sofisticação que quase diríamos inesperada num local como este. Se passarem perto, não percam a oportunidade de uma visita. Mas reservem antes, porque o restaurante já é muito conhecido por quem sabe destas coisas.
Regressámos também, em Amarante, ao "Largo do Paço", integrado na "Casa da Calçada" (atenção: não estamos a falar do clássico e vizinho "Zé da Calçada"!). Num espaço hoteleiro belíssimo, é fantástico poder ter nesta zona fronteira entre o Douro Litoral e Trás-os-Montes uma restaurante com uma "estrela" no guia Michelin. Comeu-se muito bem, a um preço elevado, com um serviço muito cuidado e uma apresentação soberba. Este não é um local onde se possa ir com frequência, mas é importante dar conta e valorizar o esforço feito para garantir esta cozinha de grande nível, que pode e dever ser uma âncora para uma zona turística que merece ser melhor conhecida. Uma vez não são vezes: dê-se ao luxo de uma visita ao "Largo do Paço".
Em Vila Real, passámos pelo "Paulo", uma casa despretenciosa no Bairro da Araucária, perto do "circuito", onde, contudo, se servem doses generosas, sempre com uma qualidade muito apreciável. A apresentação é simples, o espaço nada tem de especial, o serviço, em particular ao fim de semana, pode ser algo demorado. Mas a relação qualidade/preço é muito convidativa e há sempre lugares, sendo que o estacionamento não é difícil, fator não despiciendo nos dias que correm.
Em Vila Pouca de Aguiar, experimentámos o "Costa do Sol", no Hotel Aguiar da Pena, na descida para a vila, para quem acede da A24. Como já por aqui assinalámos, tínhamos a terra por um verdadeiro "deserto" gastronómico. Este restaurante, que existe já há alguns anos mas nos tinha passado desapercebido, constitui, a grande distância, o melhor que a terra tem hoje para oferecer. Num espaço agradável e desafogado, um serviço atento e uma lista, que não sendo muito alargada, tem uma diversidade regional de assinalar, trata-se de uma opção interessante, a merecer uma nova visita.
Um pouco adiante, nas Pedras Salgadas, uma terra que, cada vez mais, merece uma visita ao seu belo parque, voltámos a "O Conde", um pouso seguro, de comida sã, não muito variada mas bem cozinhada, num espaço simples e, no nosso caso, amigo de há largos anos.
Ainda nas Pedras Salgadas, resolvemos uma noite experimentar o "Refúgio", uma casa já com uns dois ou três anos e que se anuncia como pizzaria e especializada em grelhados. Experimentámos as pizzas, arte em que pareceram menos apurados. Numa outra vez, iremos verificar os grelhados. O ambiente é solto, simples, com muitos emigrantes à mistura. O serviço é atento, embora em dias de enchente o ritmo de atendimento se ressinta.
Numa saltada a Chaves, fomos rever "O Carvalho". De longe, esta continua a ser a melhor opção na cidade, que se recomenda sem reservas. Num ambiente simpático, com acolhimento de província que se torna muito agradável, este restaurante dá uma constante garantia de qualidade, sem nunca termos detetado falhas em qualquer das visitas efetuadas. A oferta é equilibrada, com pratos clássicos apoiados em produtos de excelente qualidade. O serviço é profissional, a relação qualidade/preço não merece objeções. Este tipo de restaurantes "irritam-me" sempre: fazem-me perder a vontade de ir experimentar outros locais...
De regresso a Vila Real, decidimos voltar ao "Cais da Villa", ali ao lado da estação ferroviária, no que era um seu antigo armazém. E não nos arrependemos, nem por um segundo. Continua a ser a melhor opção da cidade. A lista melhorou substancialmente, tudo o que se experimentou estava excelente. O espaço continua muito bonito, a zona exterior, com lista própria, é muito agradável e convida a uma bebida prévia ao repasto. A conta, ao jantar, não é "leve", mas é bem adequada ao que se consumiu (ao almoço, há um "menu executivo", que já exprimentámos, com uma magnífica relação qualidade/preço). Ah! E a carta de vinhos é soberba, com os Douro em grande e natural evidência.
Terminámos esta jornada nortenha no "Lameirão", a minha "cantina" vilarealense. Lista curta, que varia todos os dias. Por exemplo, hoje eram tripas aos molhos, feijoada e carne assada. Amanhã tudo mudará. Mas não se deve abrir a refeição sem antes expetimentar os rissóis e a bola de carne. A conta final é sempre uma boa surpresa. Quem dera que o país estivesse coberto de casas como esta, que fazem juz ao cultivo da cozinha portuguesa tradicional, sem outra ambição que não seja a preservação da qualidade e o sustento do bom paladar!

24.6.14

Romaria ao S. João

Uma deslocação para as festas do S. João, no Porto, não poderia resumir-se, naturalmente, a umas sardinhas (de preferência não congeladas) locais, acompanhadas por um verde tinto. Já que decidimos ir para o Norte, haveria que aproveitar o ensejo para algumas sortidas gastronómicas.
 
Saindo de Lisboa no sábado, pensámos em algumas hipóteses em redor da A8/A17. Excluídas - em absoluto! - todas as áreas de serviço desse percurso, já não pudemos contar com o Trás da Orelha, uma saudosa casa na primeira saída para Torres Vedras, há meses desaparecida. Almoçar no excelente Tribeca, em Serra d'El Rei, ou no muito recomendável Traçadinho, bem perto de Óbidos, seriam boas opções, como o seria o magnífico Sabores de Itália, nas Caldas da Raínha. Mas era cedo. Rumámos assim a Aveiro, tendo decido aportar, uma vez mais, no

 
Os bacalhaus são os pratos fortes da casa. Desta vez, porém, não obstante a qualidade do produto, a confeção das duas versões experimentadas ficou algo distante das provas anteriores, como se deixou registado aos funcionários. É um local bonito, de preços bastante elevados, que parece necessitar de mais algum cuidado na cozinha. Mas estou aberto ao contraditório...
 
E de Aveiro partimos para Guimarães. A tentação, sempre que andamos nessa área, é ir ao S. Gião, em Moreira de Cónegos, a grande catedral gastronómica do Norte, onde a mão de mestre de Pedro Nunes dá sólidas garantias de inolvidáveis experiências. A própria cidade de Guimarães tem espaços muito interessantes e dignos de visita, como é o caso do Café Oriental ou do novo Nora do Zé da Curva, entre outros. Mas, a curiosidade de revisitar um lugar que começa a ser de culto, foi maior. E assim decidimo-nos pelo 

 
 
A casa de Dalila e Renato Cunha justifica amplamente o "Garfo d'Ouro" este ano atribuído pelo Expresso. Foi um jantar soberbo, com um menu de degustação, deixado à criatividade do chefe, com uma muito boa harmonização de vinhos. Saímos amplamente satisfeitos.
 
O dia seguinte, por ser domingo, fechava algumas portas. Pensámos ir a Barcelos. A clássica Bagoeira está sempre aberta e andamos há uns tempos para regressar à Pedra Furada. Também Braga esteve na nossa mira. O Arcoense seria melhor hipótese na cidade, mas também apetecia confirmar como vai andando o Flor de Sal. Mas decidimo-nos por almoçar em Ponte de Lima. Aí, as escolhas são muitas. Mas, ao domingo, o Bocados, a nossa primeira opção, estava fechado. A Carvalheira estava "à cunha", o Encanada e o Manuel Padeiro transbordavam de turistas. Ainda pensámos dar uma saltada a Viana do Castelo, onde o Laranjeira e a Tasquinha da Linda estavam abertos e eram uma opção segura. Mas decidimos tentar, ainda em Ponte de Lima, um restaurante de que nos tinham falado bem e que, um tanto surpreendentemente, tinha pouca gente. E assim fomos a 
 
 
Não nos arrependemos! Comeu-se muito bem, num ambiente rústico, com um serviço muito atencioso e uma variedade de escolha bastante apreciável, a um preço aceitável. Voltaremos um dia.
 
A noite ia ser já passada no Porto, porque o S. João aproximava-se. Jantar ao domingo no Porto, não é fácil, embora haja muito boas opções em Leça ou em Matosinhos (como a Marisqueira ou a Antiga). Alguns clássicos de confiança do Porto estavam encerrados: o DOP ou o Pedro Lemos, num estilo, o Aleixo, a Cozinha do Manel, noutro. Abertos e de qualidade estavam o sempre excelente Cafeína e a sua alma gémea do outro lado da rua, o Terra. E também o Paparico, embora num lugar bem longínquo, que já não visitamos desde que de lá partiu o amigo Cardoso. Mas o dia fora longo e uma opção mais ligeira impunha-se. Foi assim que acabámos por ir parar (embora não de elétrico, que passa a palmos) a uma das casas mais em voga nos últimos tempo, a
 
 
É difícil descrever a oferta gastronómica deste pequeno restaurante, em frente à foz do Douro. Trata-se de uma lista que muda mensalmente e onde o chefe João Lameira combina, numa espécie muito original de "fusão", produtos muito variados, em doses que se partilham e acabam por redundar numa bela refeição. Experimentem!
 
No dia seguinte, 2ª feira, dia de S. João, havia que ter a coragem de rumar à Ribeira e por lá almoçar. A conselho avisado de amigos que se nos juntaram, tivemos uma soberba refeição na
 
Adega de São Nicolau
 
 
Trata-se de um espaço pequeno mas muito bem aproveitado. E de grande qualidade. Por lá encontrámos, com convidados estrangeiros, o presidente da municipalidade, o que é quase um cartão de visita para a casa...
 
Restava a noite de S. João, propriamente dita. Ir para um restaurante vulgar era um desperdício. Abancar numa mesa de uma tasca da Ribeira a comer sardinhas, sendo embora típico, era a garantia de um tempo algo incómodo, desde logo pela espera, além da experiência gustativa banalíssima. Foi então que me recordei que, há meses, estivera num lugar com uma vista esplendorosa sobre o Douro e a ponte D. Luís, o que permitiria uma quase imbatível vista do fogo de artifício da meia-noite. Restava saber se haveria lugares. Por um milagre, restava uma mesa! Foi assim que acabámos por jantar no
 
 
O restaurante situa-se nas caves Graham's, em Gaia. O jantar não desiludiu. O "menu de S. João" era simples. Para além das sardinhas - muito boas! - comeu-se a grande especialidade da casa, a "vaca velha de Trás-os-Montes", uma carne maturada ao natural. A refeição foi longa. Veio a meia-noite, houve várias libações, lançaram-se balões e fez-se a festa.
 
3ª feira. Regresso a Lisboa. O almoço fez-se por Espinho, uma terra infelizmente um pouco descaraterizada. Tinham-me falado de um espaço gémeo da "Casa de Pasto da Palmeira", no Porto. E assim se fez um almoço leve e muito agradável no 
 
 
Depois deste périplo, só posso revelar que a caseira refeição final do dia foi acompanhada a "Pedras"...


6.3.14

Paris à mesa

Há pouco, um amigo telefonou-me a pedir o nome de alguns restaurantes recomendáveis em Paris, para onde parte amanhã, em visita turística. Foi nesse instante que me recordei de que, há um ano, publiquei na revista "Epicur", que inseria uma entrevista comigo, um texto que me pareceu adequado enviar-lhe. O artigo chamava-se, significativamente, "L'embarras du choix" e queria assim significar a dificuldade em fazer uma escolha num universo de restaurantes como aquele que Paris tem.

Dei-me agora conta que este blogue, onde deixo algumas notas sobre restaurantes, deveria ter acolhido esse texto (que, recordo, tem já um ano). Ele aqui fica:

Os franceses têm uma expressão sonora para designar a dificuldade na seleção de uma opção: “l’embarras du choix”. Numa cidade como Paris, a escolha de um restaurante adequa-se bem a essa fórmula. A liberdade que me foi dada pela Epicur, para designar uma mesa parisiense da minha preferência, onde nos pudessemos juntar à conversa solta, confrontou-me com esse agradável dilema. E, de caminho, fez-me refletir sobre outras coisas mais.

Com Nova Iorque e Londres, ambas hoje ameaçadas de perto por São Paulo, Paris é dos lugares do mundo onde a multiplicidade de opções gastronómicas é mais rica, nomeadamente naquilo que alguns designam, às vezes ironicamente, por cozinhas “étnicas”. Porém, ao contrário dessas outras cidades, que vivem essencialmente da diversidade e do cosmopolitismo que lhe está associado, a capital francesa tem ainda o orgulho de ser a sede incontestada de uma gastronomia nacional que ganhou foros lendários no imaginário global. Nesse domínio, encontra-se em Paris um pouco de tudo: desde a “haute cuisine” de autor, presente em locais consagrados da restauração, até a uma imensidão de “bistrots” e “brasseries”, passando por uma alguma gastronomia de “terroir”, marcada por um afirmado e orgulhoso cariz regional. Muitas dessas mesas de restauração “franco-francesa” cultivam, aliás, uma espécie de snobismo imobilista, que os habitantes locais parecem apreciar – não fosse a França, aos meus olhos, um dos países mais conservadores do mundo.

Como olha um embaixador os restaurantes do país onde está acreditado? É dado por adquirido que os diplomatas são os felizes usufrutuários de uma vida recheada de prazeres – no mínimo, os prazeres da mesa... É uma guerra perdida tentar lutar contra a ideia feita de que a diplomacia é uma espécie de festa culinária permanente, um saltitar entre cocktails e ágapes bem regados, consumidos entre ditos espirituosos e conversas ocas, exercícios de rebuscada elegância e muito dandysmo, para tragédia do erário e irritação dos “gaspares” que o policiam. Num misto de inveja e pequena raiva, a imagem colou-se-nos à pele, para sempre, sendo impossível vender uma explicação serena sobre o que, na realidade, nos compete fazer. Valha a verdade que alguns, dentre nós, sempre ajudaram a essa “festa”, num culto hedonista feito de um engravatado vazio de ideias e de um deslumbrado frenesim pela “Caras” e outras feirantes vaidades, onde confundem com importância o mero “upgrading” social que a sua conjuntural função acarreta. E uns pagam pelos outros.

A vida diplomática não é nada disso, embora tenha uma irrecusável componente social, que só os patetas desprezam, embora apenas os tontos magnifiquem. Com os anos, aprendi que o êxito de uma representação diplomática, com algum sucesso, consiste em conseguir suportar, com estoicismo e bom fígado, o inevitável frenesim social de certos períodos, embora sem disso “fazer vida”. Aqui entre nós, devo dizer que, ao longo dos anos, fui-me progressivamente reconvertendo à figura de um discreto “fugitivo” social, fazendos os “mínimos” neste domínio, sem nunca me deixar absorver pela “espuma dos dias” da vertigem diplomática. Mas os cocktails, os almoços (e os sinistros pequenos almoços!) de trabalho, os “dinners en ville” e os convites para “o campo”, tudo isso faz parte de um cardápio de obrigações a que um diplomata – e, por maioria de razão, um embaixador – se não pode nem deve furtar, por completo. É preciso ter sempre presente, porque às vezes isso é esquecido, que a grande maioria dos convites que recebemos é feita num registo de grande simpatia, por gente educada e respeitável, a cujo gesto é deselegante não corresponder. E que, nesse mundo de sociabilidade organizada, acabamos por conhecer muitas pessoas que se tornam úteis para os nossos interesses profissionais, ao mesmo tempo que alimentamos um círculo de relações que tem como agradável ponto comum o facto de apreciarem o país que representamos. O que, no nosso caso particular, é muito importante, em especial nos tempos em que Portugal não anda propriamente nos patamares da glória.

Mas voltemos aos restaurantes de Paris, porque é isso que hoje aqui nos motiva a escrita. Foi-me dito pela Epicur que escolhesse um lugar de que eu gostasse. Coisa difícil. Ao longo destes anos de Paris, e já antes de aqui viver, tenho conhecido muitos restaurantes por esta cidade, de todo o tipo e de toda a qualidade. Devo confessar que muitos dentre eles só visitei porque alguém, simpaticamente, antecipadamente se dispôs a pagar a fatura. Contrariamente ao que se julga, o salário dos diplomatas, não dando razões de queixa, não dá para grandes aventuras. Na maioria dos casos, retribuí esses convites na minha própria casa, da forma como entendo e sei receber os amigos e os conhecidos. E não me tenho dado mal com o sistema.

Por essa razão, porque desde muito cedo entendi que, pelos “cabedais” financeiros de que dispunha, nunca iria ser visitante habitual de alguns grandes nomes da restauração, desisti, por exemplo, para os lados dos Champs Elysées, da frequência das salas elegantes do sublime Lasserre, da serenidade dos almoços no Guy Savoy, do discreto mas quase insuperável Taillevent, do classicismo profissional do Laurent ou mesmo do sempre “trendy” Le Fouquet’s. Do outro lado do rio, concluí que também não iria muito ao Jules Verne, no 2º piso da Tour Eiffel, ou, bem mais adiante, a essa “meca”, laqueada a patos, que é o mitológico Tour d’Argent, onde a carta de vinhos é um calhamaço apenas para encher o olho e esvaziar a carteira. Fiz o mesmo quanto à sofisticação elegante do l’Ambroisie, não muito longe dali, na place des Vosges, também já coisa para outras bolsas. O mesmo sucedeu com uma “espécie” com que me reconciliei em Paris, mas com a qual havia sempre embirrado, em todo o mundo: os restaurantes de hotel. É que a capital francesa tem alguns dos seus grandes restaurantes inscrustados em hotéis, de que são bons exemplos o fantástico Pierre Gagnaire no Hotel Balzac, o Le Cinq, no George V, o Meurice ou o Bristol, nos hotéis do mesmo nome, ou o Alain Ducasse no Plaza Athénée. Algo perto desse nível estão os heterónimos de Joel Robuchon, os longínquos Pré Catelan ou La Grande Cascade, ou ainda o Apicius, com a criatividade que Vigato lhe transmite. Um amigo levou-me um dia, numa reserva com meses de antecedência, ao fantástico L’Astrance e, num jantar especial, perdi a cabeça mas ganhei um grande momento no Arpège. Mas, confesso, nunca fui a outros lugares ditos “imperdíveis” como o Le Grand Véfour, o Bon Accueil, l’Espadon ou o Ledoyen.

Neste mundo de nomes e sabores, onde poderia eu levar, afinal, a Epicur?

Pensei em lugares clássicos, como o simpático Chez Georges, na porte Maillot, o “incontornável” Benoît ou o muito “XVIème” Le Flandrin. Podia também optar pela espampanância um tanto gasta da Closerie de Lilas ou, ali perto, pela tradicional La Coupole, a menos que quisesse ir para um seu émulo do outro lado da cidade, lá para a Bastille, o sempre interessante Bofinger. A hipótese do tradicional Allard surgiu-me, mas logo a afastei, pelo trânsito e pelos turistas. Ainda pensei numa solução contemporânea, como o Hotel du Nord, junto ao canal Saint. Martin. E se fôssemos para nomes mais “batidos”? Talvez, cada um ao seu estilo, ir ao Au Pied de Cochon, ao Procope, ao Lapérouse ou ao Ami Louis, mas achei que a graça de um almoço divertido se perderia por aí. Pensei em recordar o jantar de Obama no Fontaine de Mars. Se estivesse um dia de sol, valeria a pena ver as caras bonitas que sempre animam o L’Esplanade, o Café Marly, o Emporio Armani Caffé ou o Mini Palais. Em matéria de segurança culinária, lembrei-me do Joséphine-Chez Dumonet, onde sempre comi bem, ou, solução das soluções, pedir ao Jean Louis para me garantir uma boa mesa, “à direita”, na Lipp. Ou, mesmo, se a fome não fosse muita, atravessar a rua e ir ao Café de Flore, onde o Francis faria provar à Epicur um “Welsh rarebit”? Estando ali perto, uma outra ideia seria visitar o simples mas excelente Le Perron ou, continuando nos italianos, a boa cozinha, servida por caras larocas, no bem mais alegre La Bocca della Verità. Se optasse por zonas mais vizinhas de casa, uma hipótese seria o acolhedor Relais du Bois, o vestusto Le Petit Retro com azulejos inesquecíveis ou a sempre confiável Brasserie de la Poste, onde, contudo, só há música à noite. Indo um pouco mais longe, poderíamos tentar o menu mais imaginativo do Beaujolais d’Auteuil ou, num registo muito diverso, a insuperável carne do acanhado Gourmet de Ternes. Neste caso, logo virando a esquina, também podíamos ir aos mariscos da La Lorraine mas, para tal produto, então ficaríamos bem servidos no Stella, outra vez perto de casa, onde o meu colega e poeta Luis Castro Mendes celebra, com teimosa regularidade, as suas juras eternas de amor. Estive, enfim, perto de ir às minha última “descoberta”, a cozinha moderna do animado Waknine. Mas não, acabei por escolher o Comme Chez Maman.

O Comme Chez Maman fica no XVIIème, em Batignolles, e foi-me assinalado pelo meu amigo Pierre Léglise-Costa, uma das grandes referências da cultura franco-portuguesa em Paris. Trata-se de um restaurante moderno, de uma cozinha francesa onde o toque belga é dado pelo chefe Wim Van Gorp. Abrimos com um prato da época, umas “moules” (mexilhões) cozinhadas ao forno e trazidas numa placa quente, bem condimentadas. Passámos depois a um clássico francês, a “blanquette de veau aux olives”, um prato que fazia as delícias do comissário Maigret, à mesa da (inexistente) brasserie Dauphine, saído para almoçar do 36 do quai des Orfèvres, nas páginas imortais de Georges Simenon. Experimentou-se também o “pot au feu”, que se revelou extremamente saboroso.

Nas sobremesas, dividimo-nos. Eu optei por uma “gaufre sublime”, uma vez mais a dar o tom belga da casa, que estava com a textura “crispy” adequada. Os dois outros convivas foram para dois clássicos franceses – e disseram terem feito boas escolhas: a “tarte tatin” e o “moeleux au chocolat”.

Nos álcoois, deixámo-nos guiar pelas recomendações da casa. Abrimos com um branco “Domaine de Pellehaut”, “Harmonie de Gascogne”, 2011. Seco, foi bebido bem fresco e satisfez, com um aroma frutado e um travo final intenso e agradável na boca. De seguida, escolhemos um tinto “Calèches de Lanessan”, 2009, da região de Haut-Médoc, onde predominam castas Merlot e Cabernet Sauvignon, um vinho forte, suave e frutado. Ambos foram excelentes opções, com razoável relação qualidade/preço.

“There is no such a thing as a free lunch” é a expressão clássica que costuma qualificar a incógnita da compensação de um convite. É uma “verdade como punhos”, confirmado por este simpático almoço para o qual a Epicur me convidou. O qual teve, como “obrigação” retributiva, que fiz com prazer, a escrita do que (talvez) tenham tido a paciência de aqui ler e que, quem sabe?, pode ajudar os leitores que venham a Paris, se acaso entenderem que os diplomatas são confiáveis nos seus gostos.

8.1.14

Mesas perdidas

Numa Lisboa fulgurante em novidades de restauração, mesmo em tempos de crise, ocorre, por contraponto, talvez inevitável, o encerramento de alguns restaurantes tradicionais. Hoje quero dar nota de dois.
 
A maior surpresa, pelo menos para mim, foi o fecho do "Coelho da Rocha", na rua do mesmo nome, uma espécie de "Gambrinus" de Campo de Ourique, um lugar onde se ir para almoços profissionais e para jantares de amigos, com um serviço clássico sempre de muito boa qualidade e atenção profissional. Tal como na supracitada casa da Baixa, de onde eram originários os fundadores do "Coelho da Rocha", as refeições começavam com as torradas molhadas em manteiga, um choque de colesterol e gosto. Em especial, havia por lá o famoso empadão de lebre, que ali chamou gerações de glutões.
 
O segundo encerramento a notar foi o da "Isaura", um restaurante na avenida de Paris, já perto da avenida Almirante Reis. Da última vez que por lá passei, achei o restaurante triste e sem chama, o que se refletia mesmo num serviço que já fora mais atencioso e discreto. Mas havia sido um lugar de muito boa comida, também num género lisboeta tradicional. Logo à entrada, depois de um espaço cuja utilidade nunca descortinei, descia-se uma escada difícil para uma sala ampla, rodeada de estantes onde pousavam os vinhos, cuja escolha, no meu caso, justificava quase sempre uma peregrinação cuidada. Nos fins-de-semana era pouso de famílias dos bairros vizinhos, muitas vezes com crianças. Tinha a belíssima caraterística de estar aberto aos domingos.
 
Deixo aqui imagens do "Coelho da Rocha" (em cima) e do "Isaura" (em baixo).

Eusébio e os restaurantes

Eusébio da Silva Ferreira, que agora morreu, era um homem que gostava da mesa, da comida, das longas conversas com amigos.

A "Adega da Tia Matilde" (na imagem) era, sem a menor dúvida, o seu local preferido. Vi-o por lá algumas vezes. Na tradicional casa da rua da Beneficência, onde Eusébio almoçava quase diariamente (depois de uma recente "alta" hospitalar, insistiu ir diretamente para lá), continua a comer-se muito bem. E é o único lugar que pode reivindicar, com justiça, o estatuto do "restaurante do Eusébio".

Já há uns anos, via-o também muito pelo "A Paz", no largo da Paz, à Ajuda. As poucas palavras que, em toda a vida, troquei com Eusébio foram precisamente nesse restaurante, que chegou a ser um marco na zona ocidental da cidade.

Um outro local que Eusébio frequentava, em especial com grupos de amigos ou em datas especiais, era o "Solar dos Presuntos", na rua das Portas de Santo Antão, um clássico lisboeta, de muito boa qualidade, muito marcado pela figura do seu proprietário, Evaristo, que chegou a desempenhar as funções de cozinheiro da seleção.

Mais recentemente, Eusébio - dizem-me - parava com frequência no "Sete Mares", uma excelente cervejaria na avenida Columbano Bordalo Pinheiro, entre a praça de Espanha e Sete Rios.

7.1.14

O fim do Shis?

Era um excelente restaurante, num sítio que considerávamos privilegiado, sobre a praia da Foz, no Porto. O Shis não terá resistido à fúria das ondas, na tarde de ontem.

Terei imensa pena se o Shis vier a desaparecer. Almocei e jantei por lá várias vezes, com familiares e amigos que, estou certo, partilharão esta minha tristeza.