17.12.22

Casa do Baixinho (Paredes)


Como se lá chega não sei explicar, mas qualquer GPS ajuda a percorrer, a partir da A4 ou do centro de Paredes, uns escassos quilómetros até chegar à Casa do Baixinho, no nº 447 da rua do Paço, numa zona rural. 

Entra-se por um pátio onde, diz-me a dona Paula, a dona, no verão se come ao ar livre. Dentro, o ambiente é o que se vê e não difere muito de casas similares: pedra, madeira, lareira. Ah! E não há por ali ninguém “baixinho”. É o nome da quinta!

A lista é curta, mas as entradas são abundantes. Entre outras, somando o couvert, anotei queijo, presunto, salpicão, pataniscas, feijoada, cogumelos recheados, croquetes, entrecosto, rojões, azeitonas, moelas, pimentos, etc. Se resistir a tudo isto (resisti a menos de metade…), pode avançar para os pratos: há dois bacalhaus (escolhemos o folhado, com creme béchamel, que estava muito bom, havendo outro com broa) ou um naco com feijão preto e arroz. Às quintas, há arroz de pato. Ao domingo (em que só abre ao almoço), têm cabrito e vitela assada. Por encomenda (tlf. 255 785 808), há mais escolha. As sobremesas são variadas e debitadas pela dona Paula, mas podem ser vistas numa mesa no meio da sala, de onde discretamente surripiei uns figos secos.

A lista de vinhos, com o Douro naturalmente a predominar, não sendo deslumbrante, é muito aceitável. O preço final foi muito honesto, pelo que só posso recomendar uma visita. Permanece uma dúvida: quem terá sido o amigo que, há meses, me “receitou” esta Casa do Baixinho? Não é por nada, é só para lhe agradecer!

9.12.22

Feito ao bife!



Passei ontem por lá, pelo Café de São Bento, na hora noturna pós-espetáculos em que mais gosto de ir. Tinha lido que houve mudança de gerência e que iria haver alterações. Por ora, que eu desse conta, são poucas: algum pessoal novo mas simpático, aumento sensível de alguns preços e fim das meias garrafas de vinho (truque desagradável para promover o cada vez mais rentável vinho ao copo). O bife continua muito bom e essa é a medida clássica de uma casa onde, contudo, quase sempre nos esquecemos de que existem outros pratos. Por exemplo, o “strudel” de bacalhau estava excelente. O serviço continua com grande simpatia e profissionalismo, o que foi sempre uma marca da casa. Que as futuras mudanças não levem o Café de S. Bento a perder-se e a perder a afetividade de quem dele gosta, como é, de há muito, o meu caso, é tudo o que desejo.

4.12.22

Évora à mesa


A “pedido de várias famílias”, aqui fica uma nota sobre a oferta gastronómica em Évora.

Évora é um paraíso da restauração. Depois de Lisboa e do Porto, é, sem a menor dúvida, a cidade portuguesa com melhor oferta. 

Além dos dois restaurantes referidos - “Tua Madre” e “Tasquinha do Oliveira” - há muito mais, desde logo o clássico “Fialho”, uma “catedral”, desde há muitos anos. No “Moinho do Cu Torto” come-se bem, no “Guião” também, o “Luar de Janeiro” é um lugar seguro e o “Dom Joaquim” garantiu, em poucos anos, um lugar próprio. Creio que foi o “Origens” que abriu lugar à modernidade culinária na cidade, que está também na “Enoteca” e que me dizem existir, com qualidade, no “Cavalariça” (de que só conheço o original na Comporta, de que gosto). Fui também, um dia, ao atípico “Momentos” e ao “Quarta-Feira”, que não desiludiu. 

Não conheço o novo “Santo Humberto” (o antigo era um local estimável), mas lá terei de ir um dia. Achei o “Degust’Ar” bom, mas pouco criativo. Falta-me ir à “Bruxa” e ao “Botequim da Mouraria”, mas o fígado não dá para tudo, não é?)

3.12.22

Taberna do Adro (Vila Fernando)


Ainda antes de sair do bulício ruidoso e multitudinário do Alentejo, para regressar à calmaria desértica da paisagem urbana olissiponense, decidi passar por Vila Fernando. A aldeia, que já teve no seu centro uma instituição correcional para jovens, bem memorada na arquitetura ali construída, sofre hoje de um claro declínio demográfico. Não terá mais de 300 habitantes. 

O saldo populacional, contudo, aumenta um pouco às horas de almoço e jantar, por via dos utentes da “Taberna do Adro” (que fecha às quartas, desde já aviso). Pela mão hábil da Dona Maria José Sousa uma cara hoje muito popular para quem gosta de aprender culinária pela televisão, com o marido no “backstage” e o filho e o neto a oficiarem às poucas mesas, ali se apresenta uma cozinha alentejana tradicional, sem arrebiques nem efes-e-erres, a preços pré-guerra, num ambiente agradável e acolhedor. Miguel Esteves Cardoso fez-lhe adequada menção no “Fugas” e a nossa Academia Portuguesa de Gastronomia consagrou, há pouco, a genuina divulgação mediática da cozinha alentejana que a Senhora faz (40 programas, gravados em Madrid, já há uns tempos, contou-me).

Há alguns anos, tinham sido os alertas gastronómicos dos meus amigos Fortunato da Câmara e Fernando Melo que, respetivamente no “Expresso” e no “Diário de Notícias”, me tinham obrigado a anotar este endereço, onde a vida, contudo, ainda me não tinha trazido.

A experiência desta refeição trouxe-me agora à memória, gustativa e não só, outros tempos da primeira morada do Chana do Bernardino, na Aldeia da Serra, da época originária do Chico, em São Manços, ou dos alvores do Manuel Azinheirinha, no Escoural. Da lista, que não é longa, o que se saúda, ficaram por experimentar o pastelão de espargos, que a casa recomenda, a tomatada de galinha, o cachaço de porco preto e os pezinhos, e algumas sobremesas. E nem digo o que se comeu.

Onde fica Vila Fernando? Não fica longe de Elvas, não fica longe de Estremoz e não fica longe da A6. Como diz o “Michelin”, para aquilo que se recomenda, “vaut le détour”. Fá-lo-ei mais vezes. Deixo a capa da lista, debruada a pano. Fechada, para abrir o apetite de quem lê.

2.12.22

“Andas no Larau?”


Um amigo, depois de ler por aqui algumas notas sobre uma passagem minha por Évora, telefonou-me ontem, à hora de jantar. Apanhou-me num restaurante em Estremoz, com imenso barulho. Fiquei com a impressão que disse: “Andas no Larau?”.

Fiquei intrigado. Eu estava, de facto, a jantar no restaurante Larau, mas como diabo sabia ele isso?

Na verdade, esse meu amigo tinha dito uma coisa mais prosaica: “Andas no laréu?”. (“Andar no laréu”, para quem não saiba, é andar na “boa-vai-ela”, andar na boa vida, sem nada fazer). Eu é que tinha percebido mal.

O Larau é a mais recente novidade gastronómica de Estremoz. Um restaurante muito agradável e criativo. Uma bela surpresa, que me tinha sido soprada por mais de uma fonte. (Já agora: Larau é o nome que se dá ao pano de sarapilheira utilizado na apanha da azeitona).

Há anos, Estremoz já tinha sido brindado com o surgimento do excelente restaurante que é a “Mercearia do Gadanha”. Depois, num “split” matrimonial deste, surgiu o “Alecrim”, onde se come também bastante bem. Sempre tive isso como uma “compensação” pelo facto de por ali ter desaparecido o saudoso “São Rosas”.

É que, em Estremoz, há muito que também vão os tempos áureos do “Águias de Ouro” e só resta mesmo a memória da típica “Adega do Isaías”, tão típica que cheguei a ali ver ratos entre os tonéis. (Dizem-me que o nome reabriu sob a batuta de Zé Varunca; lá terei de ir um dia!) Com o restaurante da Pousada fechado, sobrava, ao lado, a “Cadeia Quinhentista”, a que sempre resisti a ir, sei lá bem porquê. Fui lá hoje e comi muito bem! Fica a faltar-me a recomendada contemporaneidade da mesa do “Howard's Folly”. Numa outra vez será.

Agora, “ando no laréu…” Já não se pode vir “trabalhar” ao Alentejo sem suscitar comentários dos amigos! Tal está a moenga, hem!

30.11.22

12


Não cabem mais de 12 de pessoas em cada uma das salas de qualquer destes dois restaurantes de Évora, que não podem ser mais diferentes um do outro.

Ontem, fui jantar, pela primeira vez, ao “Tua Madre”, uma ousada aposta contemporânea, um “mix” difícil de definir, onde o Alentejo se cruza com influências italianas. Uma oferta surpreendente e criativa, que aconselho. Ambiente solto, propostas líquidas desconhecidas, muito boa onda.

Hoje, optei por ir almoçar a um clássico, à “Tasquinha do Oliveira”, uma casa onde regresso sempre que posso, há mais de 20 anos. Um exemplo de rigor, constância e sempre excelente qualidade. Por lá se exibe o diploma do prémio anual de cozinha tradicional portuguesa que a nossa Academia Portuguesa de Gastronomia, com grande justiça, lhe atribuiu.



29.11.22

“Colina”, Lisboa

 


No domingo, com amigos, fomos almoçar à “Colina”, numa transversal oblíqua à Duque de Ávila, junto à 5 de Outubro. Há mais de duas décadas que não visitava aquele que é, com toda a certeza (mas estou aberto a ser corrigido), aos fins de semana, um dos últimos clássicos restaurantes lisboetas frequentado por famílias burguesas. 

Não me estou a referir às tascas, com toalhas de papel, travessas metálicas e uma barulheira imensa, que cumprem hoje esse papel, como alternativa popularucha, adequada ao poder da bolsa. Falo de restaurantes serenos, com guardanapos de pano, serviço personalizado à antiga (“O seu esparregado, dona Matilde”), algumas madeiras no cenário e total ausência de pressão para se abandonar a mesa (“Ó senhor Vítor! Por favor, traga-me outro café e uma bagaceira da casa”, dizíamos, quando o nosso fígado era outro). 

No género, ali perto, por muitos anos, existiu o “Funil”, que agora se modernizou e perdeu o propósito. Também havia “O Polícia”, hoje uma sombra do que foi, e a “Adega da Tia Matilde”, que, pela minha última e infeliz experiência, há meses, devia ter ido com o cliente Eusébio para o Panteão. Da mesma natureza, na avenida de Paris, esteve, por muito tempo, o “Isaura”, para onde se entrava por uma escada em caracol, que nos levava a uma cave com estantes, onde existia uma bela “biblioteca” de vinhos. O “Pote”, na João XXI ainda hoje cumpre um pouco essa função. Num registo mais simples, e ainda nas Avenidas que um dia foram novas, tenho grandes memórias da “Imperial do Campo Pequeno”, de que fui vizinho e freguês assíduo.

Quase todos os bairros de Lisboa tiveram restaurantes do género. Aos fins de semana, era vulgar ver avós, pais e filhos, de famílias com algumas posses, em almoçaradas. Até na Baixa, o “Paris” cumpria essa função.

A “Colina” ali estava, igual à que sempre a conheci. Na clientela deste domingo descortinei vários nomes que estiveram na berra nos anos 90, a que a idade trouxe um corfortável anonimato, mas também ali cruzei um poderoso ministro deste governo (como este é um governo sem muitos ministros poderosos, é fácil lá chegar), à espera do seu “take away”.

Como é que se comeu? Bem, embora sem deslumbre. A oferta é a clássica para este tipo de casas, pratos sólidos, sem surpresas nem arrebiques. Com a casa cheia, o serviço teve o ritmo certo, tudo a sair a um custo razoável. Foi bom regressar à “Colina”! 

(“Não fales muito na “Colina”, nas redes sociais!”, alertou-me uma amiga. “Se vai lá muita gente, ficamos sem mesas!”. Arrisco).

14.11.22

Terra (Foz, Porto)


Em frente do sempre excelente “Cafeína”, na rua do Padrão, na Foz do Porto, fica o “Terra”, uma casa do mesmo proprietário - e ele ainda tem outras por ali, de diferente natureza. Ontem, chegado ao Porto, escolhi lá ir, com amigos. (Ainda pensei ir ao “Wish”, ao próprio “Cafeína”, mas optei pelo “Terra”). O “Terra” sem ser, como espaço, deslumbrante, tem uma arquitetura interior bastante agradável, numa curiosa casa tradicional da Foz. No primeiro andar, em cuja varanda (cuidado com o perigoso degrau, à entrada!) tinha almoçado, já há anos, existe uma sala simpática (na imagem). O serviço é atento, profissional, competente, informado. (A música anda por ali demasiado alta, vírus que também parece ter afetado o “Cafeína”, o que é escusado. Ontem, pelos ritmos oferecidos, devem ter deduzido simpaticamente que eu tinha menos 40 anos de idade…). As três pessoas à mesa comemos bem, embora, creio poder deduzir, sem direito a um “uáu!” final. Há um menu de cozinha asiática (como não sou competente, aqui passo, mas dizem-me que tem qualidade), outra assente numa lógica predominantemente portuguesa, embora com apontamentos gustativos menos óbvios, o que é sempre de saudar. Os preços? “Preços ucranianos”, isto é, com o “travo” de inflação que esta guerra está a provocar entre nós, um pouco por toda a parte. Tenciono regressar, em breve, ao “Terra”. Pode haver frase mais simpática para acabar um apontamento sobre um restaurante?

13.11.22

Faz Figura (Lisboa)


Foi ao almoço de hoje, no “Faz Figura”, com o sol a mostrar-nos dali um Tejo soberbo. O cozido do domingo, que o Jorge Dias sempre me recorda numa semanal SMS, lá estava, magnífico, com este tipo de descrição, num dos vários “mostruários”, a ajudar-me a regular o grau de colesterol que pretendo ingerir. Há coisas muito boas nesta Lisboa!

9.11.22

Entre Amigos (Rio de Janeiro)

 


Quando, em 2018, no Rio de Janeiro, em 2018, desapareceu o afamado restaurante de origem portuguesa “Antiquarius”, a cidade perdeu um ícone social quase sem par. Criado por Carlos Perico, chegado ao Brasil na vaga pós-25 de Abril, o “Antiquarius” passou a ser um “must” carioca, com a Lisboa que detestava a Revolução - mas não só! - a fazer dali um pouso saudosista. Mas quem gostava de Abril também por lá passava, quando podia. Eu, por exemplo.

Hoje, almocei num dos restaurantes que foram criados por gente saída da boa escola do “Antiquarius”, o “Entre Amigos”. O espaço, no meio de Botafogo, é simples, em termos de decoração. Mas tem duas coisas muito importantes: boa comida e um serviço de excelência, com uma imensa simpatia às mesas. Vivesse eu no Rio e por ali faria uma das minhas cantinas.

Carlos Perico chegou ao Brasil vindo daquela que havia sido a primeira pousada portuguesa, a Pousada de Santa Luzia, em Elvas, que tinha sido criada em 1940. Constatei que o “Entre Amigos” mantinha no “cardápio” o famoso bacalhau dourado da pousada de Elvas. Decidi arriscar e não me arrependi. Posso dizer uma coisa? Raramente tenho encontrado, em Portugal, um bacalhau dourado tão bom.

30.10.22

“A Mesa”, “The Emerald Hotel” (Lisboa)

 

Conheço o preconceito: “Restaurante de hotel? Não gosto!” É uma reação tradicional e até compreensível de muita gente, fruto de experiências em locais “plásticos”, com uma oferta standardizada e pouco apelativa, às vezes a preços especulativos. Devo dizer que, também eu, resisto muito a esse tipo de escolhas, não apenas por algumas más recordações passadas, mas, essencialmente, porque os restaurantes situados fora dos hotéis têm, em regra, muito mais graça.

Em Lisboa, vivo numa zona onde não abundam os restaurantes. A área da Lapa / Janelas Verdes, mesmo se alargada à Estrela, Madragoa e Santos, não oferece muitas hipóteses de boa qualidade.

Perto de minha casa, a curta distância, as melhores opções são, seguramente, o “Geographia”, junto ao museu de Arte Antiga, e o “Clube de Jornalistas”, no topo das Trinas. Claro que também há, ao fundo das Trinas, o “Travessa”, mas isso já implica partir para uma “conta calada” (constato agora que há muito tempo que não faço uma visita à Vivianne). Depois, há coisas simples, na Madragoa, como a estimável “Varina”, onde pontua às mesas o meu amigo Veiga, e a agradável “Osteria”. Existem ainda, na rua da Esperança, outros locais de que nunca fui cliente regular. Em Santos, onde o “Frade dos Mares” se recomenda, já não vou há muito a um pouso que teve graça e fama, no tempo que era dirigido pela Sofia, o “Guarda Mor”. Tudo o resto que por ali existe não me parece muito apelativo, apenas com uma nota simpática para o “Lezíria”, mas admito poder estar a ser algo injusto. Já um pouco mais distante, mas não a “walking distance” para um comodista profissional como assumo ser, é de justiça assinalar o “Come Prima”, um belíssimo italiano.

Um dia, olhei para dentro de um hotel novo que existe junto ao museu de Arte Antiga, entrei para ver o espaço e beber um café, pedi a lista do restaurante (pedi, é uma força de expressão: li no QR Code, única forma de chegar à ementa) e achei graça ao que ali se propunha. Era comida com agradáveis notas portuguesas, a preços bem razoáveis. Fiquei com aquilo “no ouvido” e, num domingo, decidi ir lá almoçar. Ambiente agradável, serviço atento e profissional, pratos com qualidade e variedade, podendo optar-se por soluções mais ligeiras. Já lá voltei lá duas vezes, uma das quais há poucas horas. Saí sempre satisfeito.

O restaurante “A Mesa”, no hotel “The Emerald House”, é, podem crer, uma escolha muito simpática. Mas admito que o facto de eu poder ir lá a pé, ido de casa, contribua para enviesar, pela positiva, esta minha opinião.

R das Janelas Verdes, 130
Tlf. 211 506 110

23.10.22

Solar dos Duques (Lisboa)


Quando, há pouco mais de seis anos, a Petra e o Robert tomaram conta do Solar dos Duques tenho a sensação de que alguns membros da comunidade tradicional de clientes se interrogaram sobre se o restaurante, que já era visto como um clássico, pelos padrões de Campo de Ourique, não iria ser descaraterizado.

Muitos conheciam a Petra do vizinho “Stop do Bairro” - embora eu assuma que, contrariamente a muitos amigos, nunca consegui ser um fã daquela casa. Mas uma mudança, num restaurante, nunca é sossegante. Há um forte conservadorismo nas clientelas, que as leva, em regra, a serem avessas a quebras das suas rotinas gustativas: se se vai com regularidade a uma casa é porque gostamos do que nos servem por lá, pelo que a chegada de uma nova gerência é sempre recebida com alguma dúvida.

A Petra e o Robert provaram, em pouco tempo, que as inquietações dos clientes do Solar não tinham razão de ser. Com inteligência e sensibilidade comercial, mantiveram o essencial da oferta gastronómica anterior, com escassas adaptações, pelo que rapidamente aquietaram as (também minhas, confesso) preocupações.

O Solar dos Duques mantem-se, nos dias de hoje, como uma casa sólida e com uma qualidade constante, graças a uma estabilidade na cozinha que a isso tem ajudado, embora com cíclicas flutuações no serviço de sala que os proprietários procuram colmatar.

A pandemia constituiu um abalo forte para o Solar, que esteve fechado por muito tempo, não recorrendo ao “take away”. Recordo-me de por lá ter ido, após a reabertura, em dias difíceis e quase desalentadores. Mas a Petra e o Robert conseguiram, com o seu profissionalismo e determinação, dar a volta à crise, saindo dela sem recurso a um aumento especulativo dos preços.

Para quem não conhece o Solar dos Duques, direi que se trata de um simpático restaurante burguês (é um conceito que prezo), que trabalha com produtos de qualidade, dispondo de um espaço agradável, com um bom ambiente, uma lista equilibrada e uma oferta de vinhos razoável, a preços aceitáveis, ainda que passível de alguma afinação na diversidade.

Três notas finais. A primeira para dizer que estacionar em Campo de Ourique “é obra”, salvo no parque junto à igreja, que não fica longe. A segunda é que convém reservar sempre (213 872 674), porque há dias de enchente. A terceira é que não se deve confundir, como muita gente faz, o Solar dos Duques, que fica em Campo de Ourique, com o Solar dos Nunes, em Santo Amaro, aliás, uma casa também estimável.

O Solar dos Duques continua a ser uma das minhas “cantinas” regulares em Lisboa.

21.10.22

Raposo (Lisboa)


Sei muito pouco do restaurante de que hoje falo. Não faço ideia de quando nasceu, não sou amigo dos donos, nem outras coisas que criam intimidade com o lugar e nos ajudam a escrever sobre ele.

Nasci para este restaurante há já uns bons anos, fruto de um convite de um primo que sabe da poda e não mora longe. Desde esse longínquo jantar (a “tertúlia dos primos”, uma das minhas favoritas, amesenda ali muitas vezes), fiquei com o Raposo no radar.

O Raposo fica no 58 da rua Passos Manuel, uma artéria que desemboca no Jardim Constantino e na Pascoal de Melo, que liga a Almirante Reis à Estefânea. Antes, apenas me lembro de ir por ali à Assírio & Alvim e a um clássico chamado Vaskus, um restaurante que, há muitos anos, chegou a estar na moda (passei lá há meses, já depois de reabilitado: estava apenas “assim-assim”).

O exterior do Raposo sofreu, há tempos, um toque de elegante modernidade europeizante. No interior, a decoração é mais despretensiosa, com as clássicas garrafas no balcão (que sempre passo em revista). O serviço é simpático, sem ser mesureiro, o ambiente é solto, bem disposto.

Sinto que estão a desaparecer os restaurantes do género do Raposo. E qual é o “género” do Raposo? Ora bem, são restaurantes populares “ma non troppo”, de sólida cozinha portuguesa, com qualidade e generosas quantidades, com uma oferta de pratos não exagerada, lista de vinhos competente e gente para nos aconselhar coisas novas no meio dela. E com preços razoáveis e não especulativos.

Contrariamente a muitas outras casas do género, no Raposo não nos sentimos num restaurante já “cansado”, com pessoal antigo mas displicente, com notas de regular desatenção culinária, como se já não valesse a pena fazer um esforço de brio. No Raposo (que eu tivesse dado conta!) não se pratica o erro mais comodista da mediocridade restaurativa lusitana: servir pratos diferentes com exatamente o mesmo acompanhamento. Ah! E os guardanapos são de pano, imaculados (guardanapos de papel excluem-me, em regra, do futuro de um qualquer restaurante que pretenda ser mais do que uma tasca).

O Raposo parece ter uma clientela fiel, feita de pessoas que ali sabem bem ao que vão e o que querem.. Se acaso levarem carro (aviso: continuarei a cometer sempre esse erro, para todo o lado onde vá, e prometo nunca me corrigir), preparem-se para dar algumas voltas “ao bilhar grande”. Reservem mesa (213 531 059), porque, com alguns bloguistas linguareiros a gabar o local, aquilo está muitas vezes cheio. Mas o Raposo é ainda, nos dias de hoje, um segredo bem guardado.

Uma curiosidade: o Raposo está situado naquele que é o maior quarteirão de Lisboa! Façam a experiência, vão por mim!

19.10.22

Casas do Bragal (Coimbra)

 


Coimbra, para mim, foi sempre um mistério em matéria de restauração recomendável - e deixo estas linhas expostas às balas de reação dos conimbricenses fanáticos. Por anos, e porque a abundante Bairrada era já ali perto, passávamos adiante. Nos tempos em que a sina rodoviária nos encafuava obrigatoriamente na EN 1, às vezes com longas filas para atravessar a cidade, um tio ensinou-me o “Pinto d’Ouro”, um clássico desaparecido há muito (os últimos anos foram de trágico declínio), à entrada da ponte. Do outro lado do Mondego, havia um restaurante simpático, cujo nome me escapa, logo à saída da Portagem, nos primeiros metros a caminho da estrada da Beira. Se com pressa, ia-se a uma espécie de snack-bar, cujo nome também esqueci, em frente à Auto-Industrial. Com mais tempo, numa de típico, fazia-se uma surtida ao Zé Manel, mas eu nunca fui muito de ossos. E que mais? A sério, havia o restaurante das piscinas e ainda há, mais p’ró fino e carote, mas muito bom, o “Arcadas da Capela”, na Quinta das Lágrimas. E uma ou outra coisa, como o restaurante do museu Machado de Castro, uma boa experiência. Mas tenho de me informar melhor sobre a atual oferta restaurativa em Coimbra.

Há já bastantes anos, tendo afazeres em Coimbra, telefonei a um oráculo de estimação, que sabe imenso sobre isto, perguntando por dicas. Foi ele quem me falou do “Casas do Bragal”, uma reconstrução como ideia, nas cercanias de Coimbra, de um restaurante que já tinha existido na Beira. Creio que ainda não tinha experimentado a casa, mas tinha boas referências, pelo que até lhe era útil uma “cobaia”. E lá fui. O “lá” é mais fácil de dizer do que de chegar. Não me vou pôr aqui com explicações. Metam o GPS ou telefonem, pedindo indicações. Fica a 10 minutos de carro do centro de Coimbra, embora esta seja uma cidade em que o conceito de centro é mais que discutível.

O importante é que, em Coimbra, me “viciei” na cozinha da Manuela Cerca, com a sala sob o comando do Eugénio Martins. Um espaço interessantíssimo, numa moradia de bairro, em que os pratos são pedidos enquanto nos refastelamos com um gin numa zona de sofás, rodeados de livros e revistas, só partindo para a mesa mais tarde, quando por lá já estão as seis entradas e as vitualhas centrais se aprestam a chegar. A carta vai variando. Peçam ao Eugénio sugestões de vinhos: já me fez descobrir coisas interessantes. As sobremesas estão num lugar onde sempre vou petiscar várias doçarias, para crédito da minha taxa de glicémia. Os preços, bem, os preços estão na conta de um restaurante de qualidade.

17.10.22

Paco (Lisboa)


Há quantos anos eu não ia ao “Paco”, em frente à Gulbenkian! Nesse tempo, nos anos 70 e 80, o “Paco” era a opção “do meio” entre a “Gôndola”, que já lá vai, e o “Ó Lacerda”, que estoicamente ali continua.

O “Paco” foi sempre, para mim, uma coisa da noite, como o foram, lá mais para a Avenida de Roma, a “Alga” e o “Alfredo”, ou, no Saldanha, o “Toni dos Bifes” e o “Galeto”. Fechava tarde, tinha umas coisas banais mas que nos pareciam simpáticas, talvez porque o nosso grau de exigência não fosse então muito elevado.

Levado pela nostalgia, no fim de um concerto na Gulbenkian, no sábado passado, fui jantar, para o tarde, ao “Paco”, com uns amigos.

O que é que posso dizer desta nossa experiência? Vou ser piedosamente sintético: demorarei a regressar ao “Paco” o mesmo número de anos que estive sem lá ir. Ponto.

5.10.22

Cícero (Lisboa)


Cícero Dias foi um excelente pintor pernambucano, da época do modernismo. Alguém decidiu homenageá-lo em Lisboa, criando um restaurante-bistrot em Campo de Ourique, chamado “Cícero”. Fica na rua Saraiva de Carvalho, no local onde esta artéria cruza com a Tomás da Anunciação. Os proprietários, recheados de bom gosto estético, criaram, num espaço limitado, quatro áreas diferenciadas. A obra de Cícero Dias é evocada por lá.

(Imagino que os proprietários do restaurante não façam a menor ideia de que a casa onde se instalaram alojou, por muitos anos, uma empresa brasileira, a Dimep, criada pelo português Dimas de Melo Pimenta, dedicada ao fabrico de relógios industriais. Por que sei isto? Porque a Dimep foi objeto de uma intervenção estatal, em 1975, no auge da Revolução portuguesa. E porque tive como tarefa, como jovem diplomata, dois anos mais tarde, secretariar uma comissão inter-ministerial luso-brasileira que teve de tratar de essa e de outras questões similares. E guardei para sempre o nome da Dimep (e do Pão de Açúcar) como uma delas.)

Voltando ao restaurante. A lista não é muito longa, mas está bem construída, com criatividade e muito saber. Se consultar o site, pode ficar a saber bastante, do menu aos preços: https://cicerobistrot.pt . Mas só ficará a conhecer mais se passar mesmo por lá, como eu fiz hoje, para almoçar, depois de ontem um amigo me ter falado do “Cícero”. Comi bem e gostei do serviço, muito profissional. Só posso desejar sorte à gente do “Cícero”.

27.8.22

Vela Latina (Lisboa)




Vou confessar uma coisa: durante anos, quase sempre que alguém do PSD combinava comigo um almoço, para tratar de uma questão de natureza política, tinha quase a certeza de que o restaurante sugerido seria o “Vela Latina”. O pessoal do CDS sugeria sempre coisas clássicas e centrais, às vezes clubes; os do PCP optavam por locais mais espartanos e discretos, na outra banda ou em bairros periféricos; os do Bloco eram lugares de ambiente leve mas “trendy”, com preços razoáveis; os do PS? Comem onde calha, mas sempre bem! Um dia, e no estado em que anda a academia, ainda veremos alguém fazer um doutoramento de sociologia política em torno das preferências de raíz gastronómica dos quadros políticos. Contem comigo como fonte!

O “Vela Latina”, que fica nas proximidades da Torre de Belém, tem a superior vantagem de sempre se poder estacionar o carro, usando os seus lugares privativos. Ora eu, como assumido comodista de alto coturno, faço parte de quantos, sendo tal possível, estacionam mesmo em frente à porta dos locais onde pretendem comer.

Numa certa altura, o restaurante acomodou-se, se assim se pode dizer: não evoluía, a comida era de qualidade mas não entusiasmante, o serviço era cuidado e sempre atento, mas dava ares de começar a ser uma casa “cansada”. Ia-se lá por comodismo, na lógica: “Onde vamos comer? Sei lá! Olha! Talvez ao “Vela Latina”. É fácil de estacionar…”

Depois, um dia, tudo mudou. O “Vela Latina” renovou-se. Melhorou a lista, atualizou os vinhos, reviu o mobiliário, arejou a varanda (e até parece que criou uma dimensão asiática, na antiga sala de espera. Mas essa não é a minha praia, porque, tal como dizia, com óbvio exagero, um velho amigo, há semanas desaparecido, “em matéria de restaurantes étnicos, eu não passo dos alentejanos!”). O serviço - que ali foi sempre muito simpático, note-se! - mantém-se com grande qualidade: informado e atento. E, o que é mais importante, está-se a comer muito bem.

Preço? Forte mas adequado ao conjunto do que nos proporcionam. Eu gosto, cada vez mais, do “Vela Latina”. E continuo a ver por lá amigos do PSD! Os que têm bom gosto, claro!

21.8.22

“São Gião” (Moreira de Cónegos)


Posso imaginar que, para algumas pessoas, seja uma ousadia eu dizer, sem papas na língua, que este é o melhor restaurante de Portugal. Seja! Essa é a minha opinião e, para quem aqui me acompanha, isso não é nenhuma novidade. Passei por lá ontem. A carta tem coisas novas, desde as entradas (mas repeti os clássicos figos recheados com foie gras) até às sobremesas (nunca tinha provado tonka!), passando por alguns pratos (o bacalhau salteado com espinafres e gambas estava que nem lhes digo!). Imaginação, criatividade e um uso muito competente dos produtos da terra, com os cogumelos regularmente à mão daquela cozinha. Como a ocasião impunha comemorar (só se vive uma vez!), saiu um Crasto reserva, por forma a ter um suporte líquido à altura dos sólidos que iam vindo para a mesa. Brindou-se também à memória de uma grande amiga brasileira, que adorava aquele local. Um dia não são dias! O João Nunes, na ausência momentânea do pai Pedro, fez-nos as honras da casa. Faço notar, além de tudo, que o serviço de mesa do São Gião é impecável, com a delicadeza nortenha a marcar um profissionalismo sem falhas. 20 valores! Onde fica o São Gião? Em Moreira de Cónegos, a dois passos de Guimarães, ao lado do estádio do Moreirense (que ontem deu 3-0 ao Torreense, resultado infelizmente logo copiado, com imensa falta de imaginação, ali perto). Ainda bem que Moreira de Cónegos é longe de Lisboa! Se o São Gião ficasse em Moscavide, eu já estava arruinado! Porque alguns perguntam: e o preço? Adequado, é o que posso dizer.

20.8.22

Restaurante da Pousada (Santa Maria do Bouro)


Há bastantes anos que conheço o local, que deve ser, muito provavelmente, o mais majestoso espaço de restauração comercial do país. Trata-se da sala de refeições da Pousada de Santa Maria do Bouro. Pousei agora lá, por uns dias, "para descanso do pessoal”. E todas as noites ali jantei, sempre muito bem. A carta foi renovada e está mais consistente e equilibrada. Os “amuse-bouche”, para meu gosto, podiam ter uma apresentação mais elegante. Também a carta de vinhos ganharia em ser revista. Agora que a pandemia se foi, regressaram as sobremesas à mesa central de pedra, o que foi uma excelente notícia (exceto para a minha glicose)! Última nota: o pessoal é extraordinário de simpatia!

19.8.22

“Victor” (São João de Rei)

Há anos que não falho uma ida ao “Victor”, em São João do Rei, perto da Póvoa do Lanhoso. Vou pelo bacalhau, claro!, porque essa é a escolha certa por ali. Grelhado. Não conheço melhor lugar para o saborear, com um alvarinho de qualidade a acompanhar. Do mesmo bicho norueguês, acho sempre adequado começar por uns bolinhos, feitos com ovos da casa, que tornam bem amarela a massa. A gulodice fez também com que não evitasse o leite creme queimado na ocasião. O meu amigo Victor Peixoto, que passou a fronteira dos 80 com imenso garbo e não menor estaleca, continua bem ativo da sala. Enfim, foi o que pode chamar-se um almoço sem espinhas…

17.8.22

“Cruzeiro” (Santa Maria do Bouro)


Há quantos anos conheço o "Cruzeiro", em Santa Maria do Bouro? A casa tem 63 anos. Devo ter ido por lá, a primeira vez, nos anos 80, quando o Gerês andava muito no meu roteiro regular de férias. Quase que aposto que a lista não devia andar longe daquilo que ainda hoje é: o cabrito, o bacalhau, a carne assada, as papas de sarrabulho, os rojões, o pernil e coisas assim. Até das rabanadas da casa me lembro. Hoje, voltei a almoçar lá. Era um dia “impossível”! Nos agostos, há um mundo a pousar por ali, muitos emigrantes com família, muito viajante pelo Minho, que já aprendeu onde se come bem. O “Cruzeiro” não aceita reservas para depois do meio-dia-e-meia. Assim, à chegada, há que “dar o nome” e esperar. E assim fiz e fiz muito bem. Dez minutos depois, com a casa a abarrotar, na ordem devida, estávamos sentados e tudo começou a chegar, na sequência certa, cozinha rápida, simpatia e diligência no serviço, impecável de eficiência e elegância (guardanapos de pano, claro). Ah! E comeu-se bem. Aproveitei a passagem, junto à mesa, da Dona Maria Isabel, a conhecida proprietária que ainda hoje dá uma mão, no meio daquela azáfama, para a felicitar pela qualidade do que o “Cruzeiro” há anos nos proporciona. Querem saber quanto custou um cabrito para dois, antecedido de sopa, sobremesas, pão e manteiga e meia de Esteva? 35 euros! É verdade! Como antes se dizia: há um Portugal desconhecido que espera por si.

“Beach Club” (Soltróia)


É um restaurante ciclotímico: já lá comi mal, já lá comi mais-ou-menos, alguém me recorda (porque me não lembro) de que já por lá se comeu muito bem. E que até por ali se dançou! Fui há duas semanas. Estava com uns preços, nos pratos e nos vinhos, a exagerarem muito nos algarismos. O serviço, multinacional (com bastantes brasileiros, o que dá sempre um superávite de simpatia a qualquer casa), foi competente. A comida não estava má, mas tudo depende do preço que estivermos dispostos a pagar por aquilo que nos colocam no prato. E ali pedem bastante por isso. O Beach Club é o único restaurante de Soltróia. Abre escassos meses no ano e, de certo modo, há que ter isso em conta quando olhamos para o custo de uma refeição. Mas o saldo impressionista que fiz, à saída, não foi extraordinariamente positivo. No próximo ano, volto. Sou um resistente. E espero, sinceramente, que tenham sorte!

15.8.22

Gonçalves (Carrasqueira)


O Retiro do Pescador (da Sílvia) estava fechado. O Rola não atendia o telefone. A Escola também não. O Grão de Bico não servia jantares. Aquilo, lá por Tróia, está sem grande graça. Achámos que, na Comporta, o São João e a Cervejaria não deviam ter lugares. Nem pensei em tentar conseguir uma mesa, a uma hora decente (às vezes, propõem que cheguemos num horário que é mais adequado a um lanche, outras vezes já a cair para uma ceia), no Dona Bia, no Gomes ou no Museu do Arroz. Nem nos restaurantes das praias, onde as melgas nos comem vivos, desde os parques de estacionamento (será minha impressão ou este ano há menos?). Decidimos, assim, ir ao Gonçalves, na Carrasqueira. Lembrei-me, ao chegar, que ali tinha cruzado, uma noite, o meu amigo Caetano da Cunha Reis (e telefonei dali à Mami, a saudar a memória do Caetano). Nesta ida ao Gonçalves, comeu-se como sempre, sem exceção, se comeu por lá: relativamente bem. O meu prato, contudo, que parecia uma coisa simples, demorou imenso a aparecer. O serviço foi agradável, mas ineficaz face à gestão temporal da cozinha, onde vislumbrei um funcionário com um turbante com a cor do rótulo da quinta do Vallado. A conta final não surpreendeu. Saldo? Treze valores, desta vez, para utilizar uma medida clássica.

14.8.22

“Cavalariça” (Comporta)


Tinha ido lá, a última vez, no saudoso tempo em que ninguém ainda tinha ouvido falar do almirante Gouveia Melo, isto é, fui lá antes da pandemia. Trazia na memória “mixed feelings”. A comida tinha sido boa, mas o serviço era um pouco “casual arrogant” (ou “a armer”, como diz, em erro francês deliberado, uma familiar minha), o preço era demasiado “puxadote”. Por essa altura (agora não é muito diferente, a bem dizer), salvo nas praias, a Comporta tinha poucas alternativas onde se podia ir à confiança. Passando ao que importa: está-se a comer muito bem, nos dias de hoje, no Cavalariça! Comida imaginativa, lista interessante, muito bem confecionada e apresentada, serviço de mesa muito agradável (que não percam o profissionalismo dessa brasileira de Santa Catarina!), preço, naturalmente, “a condizer”. Mas sai-se com a satisfação de ter gasto bem o que lá se deixou.

13.8.22

Il Mercato (Lisboa)



Já não ia há uns bons tempos a este italiano do Pateo Bagatela. Costumo assentar mais numa tertúlia, na esplanada do Páteo 51, a casa imediatamente ao lado (onde não se come nada mal, adianto desde já, e a preços que me parecem mais em conta). Uns degraus acima, parei às vezes, com o Nuno Brederode e a Céu Guerra, no Sabor & Arte (de que guardo boa memória). Ao balcão do Il Mercato vendem-se produtos alimentares de Itália, que adivinho serem bons, a ajuizar por um queijo e um presunto desgustados. No restaurante, ao almoço de hoje, a comida estava muito boa, o serviço foi (mesmo) muito atencioso, os preços não me pareceram nada especulativos. O restaurante-loja é do mesmo dono (nepalês) do Forno d’Oro (a 100 metros, onde só fui uma vez, para uma pizza, depois de ali ter deixado de ser o excelente Mezzaluna), do meu quase vizinho de casa Come Prima (onde nunca comi mal, noto) e da Casa Nepalesa, na Elias Garcia (onde, há meses, jantei bem e prometi a mim mesmo voltar). Um dia, tendo-me eu queixado, aqui pelas redes sociais, de que não fazia sentido, no Il Mercato, pagar-se ao balcão, no fim da refeição, juntamente com os clientes da loja, o que originava filas e protestos, o dono teve a gentileza de telefonar-me, dizendo que o assunto estava a ser repensado. E fizeram-no. Hoje paguei na mesa. (Uma nota prática: o Páteo Bagatela possui um conveniente parque para automóveis, por debaixo, o que é sempre um “must” a considerar).

20.7.22

Geographia (Lisboa)


O “Geographia” é, dos restaurantes “íveis” (isto é, restaurantes a que se pode ir), o que fica situado mais próximo do local onde vivo. Onde fica? Basta dizer que, da porta do restaurante, se vê a parede lateral do Museu Nacional de Arte Antiga.

Conheci a casa numa outra encarnação, bastante mais simples. De um sítio singelo (em linguagem de fado) de bairro, com o dono a conhecer pelo nome os clientes, o “Geographia” nasceu um dia, já há alguns anos, com mais ambições e sob um conceito (diz-se assim, não é?) diferente.

O tal “conceito” foi reproduzir, na oferta apresentada, pratos com reminiscências dos locais por onde os portugueses andaram. (Uma excelente ideia, quanto mais não seja para excitar o de insalubre debate sobre a ”apropriação cultural”). Estas “propostas” (também se usa, não é?) de fusão são feitas com inteligência e muito bom gosto (o bom gosto tem no gosto a sua melhor expressão), sabendo ser criativas, mas nunca entrando pela irresponsabilidade, nesta combinação de sabores.

Os puristas de comida africana, indiana ou brasileira devem ficar um tanto espantados. Eu, que sou tributário de uma herança culinária de simplória mas sólida cozinha portuguesa, sinto-me lindamente com as ousadias praticadas pelo “Geographia “. O que, para muitos, será talvez uma prova indireta de que a ousadia, por ali, não é assim tão ousada como isso.

O espaço não é deslumbrante, mas a decoração é de bom gosto. Uma insonorização mais ficaz apuraria o conforto. O pessoal (diz-se colaboradores, não é) é que, infelizmente (mas isto parece ser pecha do setor), vai e vem. É sempre gente que se percebe ter sido instruída para ser simpática, o que normalmente conseguem ser, mas, em matéria de serviço, há muito concluí que a simpatia está longe de resolver tudo. Também um pouco mais de ambição na variedade de vinhos seria desejável e, em dias de enchente, seria também muito importante não deixar acabar cedo os pratos mais icónicos (esta expressão também se usa muito, não é!) da casa.

Com as críticas atrás feitas, eu recomendo o “Geographia”? Claro que sim! Um local onde nunca comi um prato mal confecionado, com pessoal amável embora muitas vezes inexperiente, com uma cozinha que sai da vulgaridade e ousa a criatividade com bom senso e bom gosto, merece que o apoiemos. E o preço não irrita, o que ajuda. Eu sou cliente e eles já sabem: quando algo me desagrada, digo-lhes. Logo.

Se for de carro, prepare-se para andar às voltas. As reservas são essenciais, pelo 213 960 036.

17.7.22

Clube de Jornalistas (Lisboa)


Foi-se a Gôndola, apagou-se o Trinta e Três, já há muito tinha desaparecido o Antigo Retiro do Quebra-Bilhas. Outros lugares ao ar livre, às vezes com uma parreirinha (no Rato, no Campo Pequeno, na Luneta dos Quartéis), ousaram contrariar uma Lisboa que, por muitos anos, parecia amedrontada em comer sob o céu.

Há já muitos anos, no 129 da rua das Trinas, já perto da rua da Lapa, numa antiga escola primária, vi aparecer o restaurante Clube dos Jornalistas, onde o dito clube parece ter sede. Tem uma zona interior simpática mas tem, essencialmente, um fabuloso jardim nas traseiras. Por lá comemorei, em grupo, décadas de entrada para o MNE, por lá estive num casamento.

A casa teve vários tempos. Esteve muito na moda, tinha um cozinheiro creio que basco, depois passou por um período menos feliz, em que, em idas por lá (sou vizinho, a “walking distance”), dei por mim a recordar esses outros tempos melhores e a prometer não voltar. Mais recentemente, já há uns anos (estas minhas notas são impressionistas, socorro-me da memória, não “checko” nada), a qualidade do restaurante ficou bastante mais sustentada. Há uns pratos clássicos, com algum sentido de invenção, os vinhos têm escolhas pouco comuns (teve mesmo uns, cujo nome era um algarismo, que eram muito bons) e o serviço, algo “casual” contemporâneo (mas nada do “casual arrogant” que anda por aí à solta), é simpático e atento.

Há uma semana, organizei por lá uma festa de aniversário de uma pessoa e tudo correu muito bem. Disse-o, com gosto, à Luísa, que gere, com muita eficácia, o estabelecimento. Preço? Já foi mais barato, mas não acho caro. E é bom, agradável e tem aquele jardim!

Ah! E o Clube dos Jornalistas está aberto aos domingos, mesmo para jantar! Nesta época do ano, não vá sem reservar (213 977 138). Pode tentar levar carro, mas a zona não é muito dada a surgirem vagas para estacionar.

16.7.22

Jockey (Lisboa)


Para quem não conhecer o local, lá chegar pode ser uma espécie de aventura (talvez com GPS seja fácil). O Jockey é um restaurante que fica no meio do hipódromo do Campo Grande. Entra-se pelo topo norte da avenida que passa em frente à cantina e por detrás da reitoria da universidade de Lisboa. É essencial reservar (217 957 521). Dizemos ao que vamos numa cancela e procuramos o local. Há que ter cuidado onde se estaciona, porque as vagas, por ali, são como agulhas num palheiro - e ali há muita palha! Pelo caminho, não se admire se, às vezes, se cruzar com uma fauna de nariz arrebitado, a armar ao fino e a bater o tacão, claramente indisposta por interrompermos a exclusividade do seu lazer equino.

A sala é interessante, com uma espécie de reservados em modelo de “cavalariças”, onde se acomodam os grupos. No bom tempo, o restaurante abre-se para um amplo e belo espaço exterior. Come-se bastante bem, os preços não são excessivos para o ambiente e para a qualidade daquilo que nos é proposto, há uma inteligente lista de vinhos e o serviço é feito por um pessoal experiente, com simpatia profissional “standard”. Gosto bastante de ir ao Jockey, como ontem fiz, com amigos.

12.2.22

DeRaiz

 



Assim não vamos lá! Ou há mudanças drásticas ou este país não se endireita! Não há dietas que resistam, o colesterol (como a inflação, os juros e o serviço da dívida) não para de aumentar, os trigliceridos disparam, os açúcares ficam sem dono. O SNS, assim, estoura! Ou se aproveita esta maioria absoluta para pôr cobro a isto ou o país fica ingovernável!

Ontem, fui a um restaurante que se revelou “impossível”. Ia por indicação de um amigo, que sabe imenso da poda. Era, disse-me, um local “muito bom e a preços muitos decentes”. 

Pois isso! Desconfiei logo! A 12 minutos do centro de Viseu? Este tipo de lugares excêntricos criam-me sempre uma fundada suspeita. Ó meus amigos, como diria o diácono Remédios, com sotaque viseense (e é de Viseu que estamos a falar), isso não existe! Ou melhor, se acaso existe, é por más razões e a prudência básica aconselha a que seja proibido.

Ia dormir a Viseu e tinha-me perguntado: “onde é que vou jantar?” Conhecia vários restaurantes na cidade, mas apetecia-me experimentar algo de novo. Lembrei-me então de telefonar ao tal amigo que sabe destas coisas como ninguém e que, sem o saber, é, desde há alguns anos e muitas análises clínicas, um ódio profissional desconhecido do meu médico generalista. 

“Vá ao DeRaiz!”. Nunca tinha ouvido falar. Porque sou um crédulo, um ingénuo, lá fui. 

(Agora posso confessar: necessitava de passar, numa mesa para entreter, a hora e meia do Porto-Sporting da noite de ontem, não fosse dar-se o caso de ser tentado a ver na tv o “prélio” (ainda alguém se lembra desta palavra?). E, ao que parece, ainda bem que não vi!)

Na cidade das 27 rotundas, tendo por companhia sonora a conhecida menina do Wase, lá fui ao DeRaiz. 

(Um destes dias, quando não houver crianças caídas em poços em Marrocos, presumíveis terroristas lusos com saloias botijas de gaz e uma quase guerra quente na distante neve ucraniana, que serve para entreter comentadores internacionais de cabelos brancos a perorarem coisas graves, a nossa grande mídia tem de nos dar a conhecer a cara dessas gentis senhoras que nos sussurram o caminho pelas ruas, e que já bem íntimas são do nosso tímpano.)

Foram então rotundas depois de rotundas, mais saídas para a esquerda do que para direita (coisa rara na zona, mas que gera esperança de que muitas coisas se componham), quelhos e vielas, até que chegámos a um largo. Ao lado, a capela, como o nome da rua indicava, à frente, o que viria a revelar-se quase um  altar. Porque a celebração estava para vir. 

Casa de pedra rija, bem renovada, no meio da aldeia. Entrámos. Ambiente acolhedor, pessoal impecavelmente fardado para a função, profissionalíssimo, regras de higiene corretas (luvas para colocar copos e talheres), dois andares muito bem decorados.

Aquele meu amigo só podia estar a gozar: coisas assim não existem! Em especial, como dizem os britânicos, “in the middle of nowhere”!

A oferta de um bom rosé, à chegada, deixou-me logo de pé atrás. 

Veio a carta, a lista de vinhos, ambas variadas e informativas, e, surpresa das surpresas, todos os preços eram muito honestos. 

Havia ali qualquer coisa que não batia certo, pensei para comigo! Alguma coisa devia estar mal! E, claro, fiquei “na retranca”, porque já levo muitos anos de isto! Pensei: a comida deve ser muito má! 

Passado o bom “couvert”, chegaram um pastel de massa tenra e uns ovos verdes. Magníficos, com o meu ovo a surgir numa imaginativa gaiola. 

Entretanto, o tinto do Dão, escolhido sob recomendação da casa, marchava muito bem.

Começaram a pousar, depois, os pratos, com o serviço a emergir num tempo certo, não obstante a sala estar plena (de gente iludida como nós, pensei), com distância prudente entre as mesas.

Agora é que vão ser elas! Devem vir por aí umas vitualhas menores! Como o bacalhau à Brás esteve muito bom, esperei que pato assado com arroz de forno desiludisse. É o desiludes! 

Devia ser nas sobremesas que tudo se iria estragar, refleti! Era isso! Mas não é que um pão-de-ló da avó estava à altura? Ainda os provoquei ao pedir um “strudel” de ananás, mas, surpresa das surpresas!, estava também bem no ponto.

Furioso comigo mesmo, porque sabia, de ciência certa, que as coisas não podiam correr tão bem como estavam a correr, que devia haver uma explicação secreta para todo aquele inesperado acerto, aguardei pela fatura: devia vir aí uma “conta calada”, com coisas inventadas, eu sei lá! Sorrindo para dentro, com uma deliciada fúria antecipada, esperei. Preparei-me para fazer uma cenaça!

Chegou o papelinho. Li e reli! Não podia ser! Estavam a gozar comigo! Fiquei furioso! Tinha comido lindamente, com um serviço impecável, num ambiente muito agradável, por um preço honestíssimo. Isto fazia-se?!

Como é que me poderia vingar? Só tinha uma maneira: espalhar, ”urbi et orbi”, que, no DeRaiz, ali ao lado de Viseu, se come de forma magnífica. 

Se calhar, é isso!, não querem que se saiba! Pois eu digo e, agora, amanhem-se! É uma afronta servir tão bem e com preços tão honestos. Isto não se faz! A Inês e o Nuno não se podem ficar a rir de nós! É preciso que todos saibam e divulguem! 

É o que eu digo! Este país, assim, não vai lá!

22.1.22

Zambeze (Lisboa)


Fui lá, pela primeira vez, já há muitos anos. E gostei. Volto, de quando em vez, sempre sem me arrepender. Fica a meio caminho entre a rua da Madalena e o castelo, por detrás do CDS, um pouco antes do Chapitô, com o qual partilha uma deslumbrante vista sobre Lisboa. O Zambeze apresenta uma bela e competente lista onde, juntamente com a culinária portuguesa, se podem encontrar algumas notas gastronómicas moçambicanas (tal como acontece no Ibo, no Cais do Sodré), tendo aliás ao seu serviço pessoal da mesma origem, que são de uma extrema gentileza e eficácia (mas, hoje, a cozinha esteve um tanto lenta). Come-se ali muito bem, numa boa relação qualidade/preço. E para estacionar o carro, naquela área? já estou a presumir o leitor a perguntar. É muito fácil. O Zambeze fica no topo de um prédio com um amplo parque de estacionamento, ainda por cima com um conveniente Pingo Doce na base.


15.1.22

Lamassa


É no meio do Estoril, terra com ruas onde sempre me perco. Instalações simples, arejadas, sem luxos. Tem poucos lugares. Ou se vai às 19:00 ou às 21:00. O serviço é atento, profissional, diligente. Tem uma lista de vinhos que surpreende. A conta foi justa. Come-se muito bem no Lamassa, a julgar pela experiência, que há que repetir. Lead: Pelos vistos, há um belo italiano no Estoril.