Há dias, entrei por curiosidade num recém-aberto restaurante, apenas para dar uma vista de olhos na lista. A especialidade eram "petiscos", essa moda que por aí anda e se aproxima das "tapas" espanholas, ao que parece com o objetivo de captar um público menos dado às refeições longas e mais pronto a aceitar a partilha de pequenos pratos diversificados, num ambiente descontraído. Neste modelo, tenho visto um pouco de tudo: desde coisas inventivas a uma oferta gastronómica sensaborona.
O local onde entrei era interiormente agradável. Os clientes eram muito poucos, o que rimava com o olhar ansioso, mas logo desiludido, de quem me recebeu, convencido que eu ia almoçar. Nesse restaurante, a lista era demasiado concentrada num único tipo de carne - o que acho francamente limitativo para fidelizar uma clientela regular. Perceber-se-ia isso uma loja deste tipo no Mercado da Ribeira ou de Campo de Ourique. Mas não se entende a abertura deste espaço numa rua de um bairro lisboeta, já fora do seu centro, com estacionamento "impossível", sem um núcleo próximo de emissão de clientes (empresas, escolas ou outros equipamentos coletivos).
Já não é a primeira vez que dou comigo a matutar: por que diabo abriu este restaurante? E logo aqui? Que hipóteses de sobrevivência tem? Olha para os donos, normalmente gente jovem ou de meia idade que decidiu arriscar poupanças, gente que se empenha no trabalho e já se empenhou no banco, e sinto pena. Deve ser um imenso esforço investir numa casa nova, contratar gente, ficar "preso" numa tarefa que se sabe absorvente e que, para ter sucesso, não pode ter falhas e tem de garantir uma clientela regular. Há espaços novos que, à partida, se percebe logo que estão condenados ao insucesso. E ninguém lhes explicou isso? Ninguém lhes disse que aquela lista não "funciona", que aquela oferta gastronómica não traz nada de novo, que aquela zona da cidade ou está saturada ou não tem quem sustente um novo espaço?
O sucesso de um restaurante nunca está garantido. Mas, depois de décadas de frequência de milhares de restaurantes, julgo saber o que faz a desgraça de uma casa. E, tal como o outro, já não tenho dúvidas e raramente me engano. Já pensei fazer "assessoria" neste domínio...
Falo por Lisboa. Lançar um restaurante implica, essencialmente, ter alguma coisa nova a apresentar. Às vezes é o "conceito", às vezes é o produto, outras vezes é o caráter "trendy" da zona. Mas é sempre preciso que haja um motivo concreto que nos leve, pela primeira vez, a uma casa que abre. Em regra, o boca-a-boca é o fator mais eficaz: "Já foste ao X? É um local muito simpático, com excelente ambiente e come-se lá uma cozinha "de tal sítio" muito boa". Outros vão lá pela moda, pelo "Time Out" ou pelas notas nas revistas, não percebendo que, muitas vezes, há por ali muitas vezes amiguismo, lóbi, cumplicidades que vão dos copos a sítios mais íntimos. Quando não há mesmo mera publicidade travestida de análise crítica favorável.
Um fator essencial é o serviço.
Há dias, fui jantar a um restaurante aberto já há anos. O local é bom, o mobiliário mudou desde uma "encarnação" mais sofisticada, está agora convertido num rústico sem gosto, toalhas "a armar" ao popular, com candeeiros que "não rimam", sobras da anterior decoração. Quem nos atende não dá um sorriso - o homem e a mulher -, o que transforma a inquirição sobre um ou outro prato numa diálogo seco, desinteressante e desinteressado. Para quem, como nós, entra para jantar num restaurante para um tempo agradável, que investe numa hora e tal de bom ambiente, deparar com dois "morcões" de trombas é a garantia para um resultado garantido: nunca mais lá volto. Ou, como vi um dia um amigo dizer ao proprietário de um restaurante nos arredores do porto, à saida: "Sabe? Vim cá três vezes: a primeira, a única e a última!".
Por contraste, estive num restaurante renovado há poucos meses. Entrei e o dono, que não conhecia, surgiu com um sorriso, saudando-nos, dando alternativas de mesa. Depois, deu sugestões de dois ou três pratos recomendados, sem pressões. E, gentilmente, quando me aprestava para encomendar um determinado vinho, perguntou se não queríamos provar o tinto da casa, em jarro, a metade do preço. (O qual, diga-se, era excelente). A meio da refeição, servida por um funcionário atento e delicado, o patrão veio inquirir sobre a nossa satisfação sobre a refeição. Ah! e não nos encheu daqueles pratinhos de entrada que não pedimos e não fez propaganda insuportável dos doces "caseiros". Vou voltar, claro.
Como atrás referi, ninguém pode garantir o sucesso de um restaurante. Mas há fatores que "liquidam" uma casa em pouco tempo, Falarei doutros numa diferente ocasião.
Gostava de saber o nome desse que referiu no Porto !
ResponderEliminarNão vá, por azar eu lá cair por engano, Senhor Embaixador !
Caro João Meneres. Já foi há muito tempo e já fechou...
ResponderEliminarFrancisco, adorei o seu texto e com isso ganhou mais um leitor assíduo. Podia por favor partilhar de que restaurante fala no penúltimo parágrafo? Obrigado.
ResponderEliminarCaro Paulo Azevedo. Trata-se do "Europa", em Campo de Ourique. O outro não digo. Aprenderão à sua custa... Um abraço
ResponderEliminarObrigado. Imagino que não seja restaurante para merecer uma deslocação propositada, mas já guardei para o caso de procurar restaurante na zona.
ResponderEliminarExcelente artigo que aqui nos deixou. De facto, muitas vezes, penso exatamente no mesmo: o que é que este restaurante aqui está fazer com estes trombudos a atender :-)
ResponderEliminarFaz lembrar a história que um amigo contou, chegaram a um restaurante, o empregado perguntou o que queriam, dizendo que tinham uma variedade generosa de produtos. Afinal, não havia peixe naquele dia; carne, ali só vaca; vaca, só havia vitela; da vitela, só havia bife. No fim, era a única coisa que tinham naquele dia :-)
"Morcões de trombas" são verdadeiramente insuportáveis, concordo... mas, ao mesmo nível, está o "atendimento melga" repleto de mesuras e atenções, de "inhos", de interrupções despropositadas... e, pior ainda, de leves pancadinhas nas costas... De FUGIR!!!
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